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Marina: 'Bolsonaro evoca o lado escuro da força'

Marina: 'Bolsonaro evoca o lado escuro da força'

Presidenciável da Rede fala sobre eleição, prisão de Lula e aproximação com Barbosa

Publicado em 19 de abril de 2018 às 10:36

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Marina Silva. (Flick | Talita Oliveira)

A pré-candidata, que em 2010 e em 2014 recebeu quase 20 milhões de votos, mas não chegou ao segundo turno em nenhuma das disputas, usava calça e camisa pretas, um discreto blaser cru e um de seus tradicionais colares de pedras no pescoço ao receber O GLOBO em um hotel da capital paulista. Ao atacar Jair Bolsonaro, candidato do PSL, Marina Silva disse que ele evoca o “lado escuro da força”, é populista e autoritário.

A senhora apoiou Aécio Neves, apoiou o impeachment e apoiou a prisão do Lula. Mas herda parte significativa dos votos do petista, mostra o Datafolha. Como explica?

Fui vítima do PT durante a campanha. Sofri um processo de desconstrução jamais imaginado. Saí do PT de forma respeitosa. As minhas divergências com o PT foram em função do distanciamento que foi acontecendo em relação a compromissos que para mim eram inarredáveis, como a questão da sustentabilidade. E eu tenho uma posição de não ter dois pesos e duas medidas. Eu não posso combater a corrupção quando ela acontece com um campo ideológico e fazer vista grossa quando acontece em outro.

A senhora cogitou ir a São Bernardo dar um abraço no Lula quando ele estava para ser preso?

Não. Quando a dona Marisa morreu, eu liguei para o presidente Lula, me solidarizei com ele, porque ali havia uma questão de alinhamento humano. Em relação à questão política, não havia alinhamento, porque eu defendo a prisão em segunda instância, eu defendo que, uma vez assegurado o mais amplo direito de defesa, a lei deve ser aplicada igualmente para todos. O que não significa que eu não fiquei triste com tudo o que aconteceu. Por isso, talvez eu seja uma das vozes que mais vocalizem o fim do foro privilegiado. Porque é uma grande injustiça ver aqueles que têm prerrogativa de foro se escondendo atrás dele dentro do Congresso, dentro do Palácio, dentro dos ministérios. As minhas posições são sempre claras, não faço uma adaptação de discurso para ficar canibalizando os votos do PT. Acho, inclusive, que o PT deve lançar seu próprio candidato, até mesmo para ter a chance de se reinventar.

Sua pré-candidatura foi lançada no mesmo dia da prisão de Lula. Simples coincidência, coincidência infeliz ou foi de propósito?

Uma coincidência de um acontecimento na História. Um congresso de partido a gente não inventa numa semana, um congresso a gente faz depois de mais de um ano, em dois anos de preparação. E o congresso é a instância que deveria referendar a minha candidatura. Foi uma mera coincidência.

Nas suas campanhas anteriores, houve doações da Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, JBS. Hoje a lei impede esse tipo de contribuição, e a Rede tem poucos recursos do fundo partidário. Como chegar ao segundo turno?

Só uma correção: a JBS contribuiu com a campanha na época do Eduardo Campos (de quem Marina era vice em 2014), mas a prestação de contas foi feita em função de que, quando ele morreu, eu assumi no lugar. Eu gostaria que fosse feita essa correção. Eu inclusive me recusei a dialogar com a JBS, não porque eu soubesse das informações que hoje sei, mas porque os criticava duramente em função de estarem sendo beneficiados com dinheiro do BNDES. Em relação às dificuldades de hoje, faz parte do acordo que foi feito, do PT, do PMDB, do PSDB, de tentar impedir que a sociedade faça uma mudança. Mas nós vamos fazer uma campanha franciscana. Estou andando de avião de carreira, acordando 4h da manhã para pegar voos mais baratos, estamos cadastrando pessoas amigas para hospedar equipes, estamos fazendo uma espécie de Airbnb.

Pesquisas apontam uma chance real de segundo turno entre dois evangélicos: Bolsonaro, de direita, e a senhora, mais à esquerda. Como vê esse cenário?

Não gosto dessa dicotomia de dividir os candidatos de acordo com a fé que professam. Eu tenho a noção do que é o estado laico, aliás, o estado laico foi uma grande contribuição da reforma protestante, e só os que desconhecem a história advogam que ser cristão evangélico é, a priori, ser contra o estado laico. Então, eu posso até ter adversários ideológicos, mas não quero que se faça no Brasil uma guerra santa.

Qual sua opinião sobre o Bolsonaro?

Um candidato que evoca o lado escuro da força, e em momentos de crise a história já mostrou a que leva esse tipo de evocação. Um candidato de cunho populista, com viés autoritário muito forte, que não respeita direitos humanos, as minorias, e não respeita a própria democracia, muito embora usufrua dela para defender suas ideias antidemocráticas.

O que a senhora tem em comum e diferente do ex-ministro Joaquim Barbosa, que também pode ser candidato?

Bem, tenho muito respeito pelo ministro Joaquim Barbosa, acho que ele deu uma grande contribuição ao país. Obviamente que em alguns aspectos temos trajetórias de vida semelhantes, de condição de vida simples, enfim. Mas eu não quero ficar fazendo esse tipo de ilação, para que não venham querer dizer que eu estou usando isso para qualquer outra finalidade. Boa parte das pessoas não tem que provar nada. Pessoas com a nossa origem o tempo todo são desafiadas a provar que sabem pensar, falar, se portar, fazer alguma coisa.

Admite abrir mão da cabeça de chapa e ser vice?

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Acho interessante que algumas pessoas, não importa quanto eu pontue nas pesquisas, não consigam me ver como uma possível candidata à Presidência da República. Às vezes eu pergunto: será que é por eu ser mulher? Será que é porque sou de origem humilde? Será que é porque sou negra? Será que é porque sou cristã evangélica? Independentemente de toda a trajetória, de 2010, de em 2014 ter sobrevivido a um massacre e ter 22 milhões de votos, de continuar a fazer política em condições inteiramente franciscanas e, mesmo assim, estar conseguindo ter o respeito e uma intenção de votos que para qualquer um é valorizada... por que, em relação a mim, as pessoas só conseguem indagar se eu aceitaria ser vice? Por que ninguém consegue fazer uma outra pergunta? Nós tomamos uma decisão depois de uma discussão muito acurada. Temos um projeto que não dependerá das candidaturas. Estamos abertos ao diálogo? Sim, mas com muito respeito por nossa candidatura.

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