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'Seria um crime não aproveitar oportunidades do setor de petróleo'

"Seria um crime não aproveitar oportunidades do setor de petróleo"

Secretário executivo do IBP defende que exploração das reservas do pré-sal aconteça enquanto o segmento é competitivo

Publicado em 8 de abril de 2018 às 00:28

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O setor petrolífero brasileiro tenta se reerguer após passar pela sua mais grave crise. E, na visão do secretário executivo do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), Milton Costa Filho, este é o momento mais adequado para o segmento reagir. Ele defende que o país não pode deixar passar as oportunidades que o pré-sal tem potencial de criar.

“Quanto mais cedo explorarmos as nossas reservas, mais cedo vamos produzir riqueza. Se podemos produzir agora é melhor produzir enquanto somos competitivos. Seria um crime não aproveitarmos essas oportunidades. Porque isso não vai durar para sempre”, enfatizou o especialista. Ele, que trabalhou na Petrobras por 36 anos, esteve em Vitória no último dia 5 – a convite do Fórum Capixaba de Petróleo e Gás – para dar palestra sobre as perspectivas do setor.

O setor de petróleo saiu de um quadro de euforia para um de forte crise. Qual o cenário de agora?

O momento é de retomada. A crise que a indústria passou foi uma crise estruturante. Com isso, a indústria não vai ser mais aquela do passado. Agora, ela tem que ser muito mais eficiente, inclusive na questão de custos. As crises são um momento de grande aprendizado para as empresas e também de grande sofrimento para muita gente. O fato é que estamos saindo dela. A economia mundial está retomando fortemente, a economia brasileira está se recuperando e esperamos que este ano tenha um crescimento bom. E, se tivermos uma boa recuperação em 2019, a nossa indústria vai ter uma retomada muito forte. E temos potencial para isso. O momento é super adequado.

A que atribui esse otimismo?

Olhando o caso brasileiro, acho que temos que fazer justiça com o trabalho que foi realizado pelo governo federal. Não tenho dúvidas de que isso fez uma diferença muito grande. O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho (que deixou o cargo no último dia 6, um dia depois desta entrevista), foi de uma atenção muito grande para recuperar a indústria de petróleo e gás no Brasil. O time que foi montado pelo governo nessa área, como com os presidentes da Petrobras, da Eletrobras e da EPE, o diretor-geral da ANP, realmente fez diferença. Isso contribuiu para que vários entraves burocráticos do nosso marco regulatório fossem removidos e diversas iniciativas começassem a acontecer.

Quais destacaria?

Eu diria que começou com a retirada da obrigatoriedade da Petrobras de ser a única operadora do pré-sal. Isso fez com que as outras empresas viessem para o Brasil. Não é por acaso que a americana Exxon Mobil (uma das maiores companhias do mundo nesse setor) participou fortemente dos dois últimos leilões. Ela estava muito interessada em operar, em colocar suas tecnologias, o seu know-how (conhecimento) e operar aqui assim como outras. Isso não foi contra a Petrobras. A Petrobras está fazendo o papel dela também. Só que o pré-sal é muito grande e o potencial da indústria no Brasil é gigantesco. Então, tem espaço.

Sem contar que a exploração do pré-sal requer investimentos muito altos, o que dificilmente alguma companhia conseguiria fazer sozinha...

Ainda mais nesse momento em particular, em que essa crise se abateu no Brasil e o impacto na Petrobras foi muito forte. A Petrobras teve que se reposicionar e está fazendo um trabalho magnífico de recuperação. Agora, já está investindo, já está comprando áreas outra vez. Isso aí criou uma nova dinâmica na nossa indústria, com a geração de negócios. Outra dinâmica é o plano de desinvestimentos da Petrobras, que passa a ser um plano de oportunidades para as outras empresas. Tanto para as brasileiras quanto para as estrangeiras.

E muitas das oportunidades vão acontecer a partir do pré-sal...

O Brasil tem uma dádiva da natureza, que é o pré-sal. Essa é uma área com reservas espetaculares, e de uma altíssima produtividade. Para se ter uma ideia, em média, cada poço do pré-sal equivale a 40 poços do shale gas (gás de xisto) americano, então, a produtividade aqui faz com que a nossa província do pré-sal seja extremamente atraente. Já são mais de 1,6 milhão de barris sendo produzidos por 86 poços. Isso significa uma média impressionante, cerca de 20 mil barris de petróleo por poço. Isso é muito bom e não podemos perder essas oportunidades. Esse senso de urgência tem que ser compreendido pelas autoridades, pela sociedade brasileira, por todos os fornecedores. Nós temos, como sociedade, que aproveitar essa riqueza rapidamente.

Por que isso não pode ser protelado?

Porque o recado foi dado. Estamos vivendo a transição energética, sabemos que em um determinado momento vai acontecer o pico de demanda do petróleo, mas que na sequência vão vir as energias alternativas. Antigamente, ficávamos preocupados com o momento em que a demanda seria tão elevada e a produção começaria a cair, que aí os preços iriam disparar, virando um verdadeiro caos. Hoje é o contrário. As tecnologias, a inovação, os investimentos, os estudos da indústria de petróleo fizeram com que descobríssemos petróleo. Mas sabemos claramente que não vamos usar todo petróleo que está debaixo da terra.

Quantos anos o país tem para aproveitar essa riqueza? Em quanto tempo essa demanda ainda vai existir?

Muito tempo. Estima-se, afinal isso é uma coisa que ninguém tem certeza, que o pico de demanda ocorrerá em meados da próxima década. Isso significa que por muitas décadas ainda a indústria de petróleo vai ser necessária. Eu diria que entre 30 e 50 anos vai ser muito importante ainda. Mas acredito que, com o passar dos anos, muita coisa vai mudar. Sabemos que as questões ambientais e das emissões serão o grande parâmetro que vão ditar a resistência mais longa ou menos longa da nossa indústria. Por isso, já existe uma preocupação. A indústria, agora, quando desenvolve projetos, considera nos estudos essa transição energética e a competição das novas energias, como a eólica e a solar. A questão da energia é um desafio enorme para a nossa sociedade. Então, eu diria que, quanto mais cedo explorarmos as nossas reservas, mais cedo vamos produzir riqueza, ajudar a desenvolver a nossa indústria, criar empregos, formar talentos e mão de obra qualificada e gerar impostos. Isso vai ser um benefício enorme para a sociedade.

A retomada da agenda de leilões é um dos passos que garante que essas oportunidades sejam aproveitadas?

Sem dúvida. A regularidade dos leilões, a previsibilidade, é algo fundamental para as empresas. Eu tô falando tanto das operadoras de petróleo quanto parte da cadeia de fornecedoras. Então, se você não tem previsibilidade, não sabe quando vai acontecer, você não consegue planejar atividades. Como você vai manter equipes de geólogos, de engenheiros de produção, se não sabe quando vai ter trabalho. Imagine nos diversos elos da cadeia de fornecedores, empresas de menor porte que, para manter empregados e qualificá-los, é muito mais difícil. Então, a previsibilidade era uma das nossas maiores reivindicações e conseguimos. Assim, todas as empresas já estão planejando e analisando. Essa agenda vai dar outra vez dinâmica e movimentar a cadeia de fornecedores.

O que esses leilões representam em negócios?

Segundo dados da própria Agência Nacional do Petróleo (ANP), os investimentos, considerando os quatro anos de leilões previstos, podem chegar a R$ 850 bilhões. É um número fantástico, difícil até de dimensionar. O que importa nessa indústria é o compromisso de investimentos que essas empresas, que estão participando e ganham as áreas, estão oferecendo. Elas estão trazendo investimentos de dimensões muito elevadas, que vão se transformar em mais de 300 poços offshore, em 39 unidades estacionárias, que são esses navios gigantes, plataformas. Isso se traduz em mão de obra, contratação de milhares de empregados, geração de impostos.

Uma reclamação da cadeia de fornecedores é sobre a dificuldade que as empresas têm de acesso às grandes companhias. Por que isso acontece?

É difícil falar isso de uma forma geral porque cada empresa tem uma estratégia de aquisição de bens e serviços diferentes, e tem muitas empresas que vêm de países diferentes, com culturas empresariais diferentes, então, é muito difícil falar em nome de todas as empresas. Mas de maneira geral eu acho que o momento que estamos vivendo agora é de início de várias oportunidades com as rodadas de leilões, que começaram no ano passado. E, para que essa aproximação seja mais bem-sucedida, acredito que as empresas têm que procurar se engajar em iniciativas, como a da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), que está fazendo um trabalho muito interessante com os diversos elos da cadeia, porque aí você começa a ter informação e fica atualizado com o que está acontecendo. Além disso, buscar oportunidades de visitas, de viagens, de participações em feiras, tudo é importante.

E como fica o mercado de trabalho nesse cenário?

Esse é um dos grandes desafios desse momento para o país. Em meados da década passada, quando estávamos vivendo uma fase de grande euforia, até o governo teve que organizar programas para desenvolver os profissionais, afinal existia uma grande procura. Na época, foram criadas dezenas de faculdades de engenharia de petróleo no Brasil, mas aí veio a crise e milhares de pessoas perderam o emprego e tivemos um problema sério. E essa crise fez com que a geração dos profissionais mais experientes, que até então estava sendo disputadíssima, se aposentasse de vez. Assim, aconteceu a saída das gerações mais antigas e, agora, vem a entrada de novas gerações, que são jovens, têm outra cabeça, outro comportamento e são muito ligadas à tecnologia.

Considera esse novo perfil positivo?

Isso vem a calhar com todo esse avanço das tecnologias digitais, que vão causar um impacto tremendo na nossa indústria. E quem ficar de fora dessa onda, vai perder espaço. Trabalhar com big data, com robótica, com drones e inteligência artificial é essencial. O que vai acontecer é que temos que desenvolver muita gente em paralelo com a incorporação de todas essas tecnologias digitais para transformar a nossa indústria. Isso é um desafio enorme e a capacitação deve ser neste momento. Porque essa demanda está começando agora e ela vem com muita força nos próximos cinco anos.

Avalia que dependendo do próximo presidente a ser eleito, o setor de óleo e gás pode estagnar ou crescer. Até que ponto a política pode impactar esse setor?

Essa é uma pergunta difícil, tipo bola de cristal (risos). Eu realmente ficaria abismado se algum candidato ou os próximos componentes do Congresso tomassem decisões contra a indústria do petróleo. Se isso acontecer, acho que pode haver uma destruição de valor para o país incalculável. O país tem uma dívida social enorme. Precisamos de muitos recursos. E a única indústria que pode prover o Brasil de recursos enormes para saúde, educação e desenvolvimento é a indústria do petróleo. Mas o que acontece é o seguinte: se o Brasil deixar de produzir o que ele produz hoje, outro país vai produzir. E aí estaremos transferindo para outra nação empregos, impostos, royalties, todo desenvolvimento de indústrias, de prestadores de serviços. O que acontece é que nós não podemos perder essa oportunidade. Se podemos produzir agora é melhor produzir enquanto somos competitivos. Seria um crime não aproveitarmos essas oportunidades. Porque isso não vai durar para sempre. Vai ter um limite. Mas enquanto nós podemos, devemos fazer isso aí. Eu espero que o novo governo e o novo Congresso entendam a relevância da indústria do petróleo para o país, que é a maior indústria que o Brasil tem de longe.

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