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Após apoiar CPI da Lava Jato, maioria da bancada capixaba recua

Após apoiar CPI da Lava Jato, maioria da bancada capixaba recua

Sete deputados federais do ES haviam assinado o texto que criava a comissão, mas em seguida pediram para retirar assinaturas

Publicado em 19 de junho de 2018 às 20:33

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Deputados que apoiaram a CPI da Lava Jato. (Divulgação)

A criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados para investigar "possíveis manipulações" em delações premiadas passou a ser alvo de polêmica nesta terça-feira (19), em Brasília, fazendo com que boa parte dos parlamentares recuassem e tentassem retirar suas assinaturas. Entre os 190 deputados que assinaram o documento para a instalação da chamada "CPI das Delações", ou "CPI da Lava Jato", no dia 30 de maio, estão sete dos dez deputados capixabas: Evair de Melo (PP), Givaldo Vieira (PCdoB), Helder Salomão (PT), Jorge Silva (SDD), Lelo Coimbra (MDB), Marcus Vicente (PP) e Paulo Foletto (PSB).

Entre eles, cinco afirmam já ter apresentado requerimentos ao presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM), para retirar o apoio. Evair, Jorge, Marcus e Foletto mudaram de posição após a repercussão negativa de que o texto seria um instrumento de pressão contra a Operação Lava Jato. No entanto, segundo a assessoria técnica da Câmara, não é possível pedir a retirada de assinatura para a criação de CPI, pois o regimento interno da Casa não permite.

De acordo com o texto de abertura da CPI, o objeto da investigação seria a "possibilidade de manipulação das colaborações premiadas, o que indica fraude nos procedimentos e possibilidade do envolvimento de agentes públicos", a partir da investigação de denúncias de irregularidades feitas contra o advogado Antônio Figueiredo Basto e outros, ocorridas no âmbito de alguns processos de delação, cobrando uma "taxa de proteção" de US$ 50 mil mensais de outros integrantes do esquema para proteger doleiros de futuras delações.

Conforme adiantado pela coluna Vitor Vogas, o deputado Evair de Melo foi um dos primeiros a pedir para retirar o apoio, após ter admitido não ter lido o texto na íntegra antes de subscrevê-lo. "O escopo era muito grande. Quando li, vi que estava cheio de jabuti (proposta com objetivo diferente daquela que aparentava ser) e pedi para ele tirar meu nome", afirmou.

O deputado Paulo Foletto também admitiu que leu somente o cabeçalho e não identificou nenhum trecho suspeito que pudesse interferir na Lava Jato. "Um dos requerentes era o meu líder de bancada, Júlio Delgado. Sempre quando alguém questiona alguma suspeição de anormalidade, a minha prática é apoiar a investigação. A Lava Jato é um marco regulatório na política nacional, jamais faria algo que pudesse ameaçar isso."

Os deputados Marcus Vicente e Jorge Silva alegam que, ao assinar, haviam compreendido que a investigação trataria do caso específico de Basto. "Sou a favor de qualquer tipo de investigação. Meu sigilo é quebrado há 17 anos. Grupos ligados à extrema-direita estão distorcendo informações. Vou retirar meu nome, pois não apoio coisas que não sejam claras, abertas", afirmou Marcus.

MANTIDOS

Na outra linha, o deputado Givaldo Vieira (PCdoB) declarou que mantém seu apoio à CPI. "Está havendo um ataque de movimentos de direita, como o MBL, e os deputados estão cedendo a uma pressão equivocada, por isso estão retirando nomes. A CPI não é contra a Lava Jato, é contra o que tem de errado nas delações, para que não haja seletividade. Há relatos de serem oferecidas delações 'a la carte'. O texto fala em investigar essa indústria", defende.

O deputado lembra do caso do ex-procurador da República Marcelo Miller, que foi indiciado pela Polícia Federal esta semana, acusado de ter envolvimento na elaboração de acordos de colaboração de executivos do Grupo J&F, ao qual pertence o empresário Joesley Batista.

Helder Salomão (PT) também não retirou a assinatura. "Há denúncias e indícios de negociações e venda de delações entre advogados e promotores. Essas negociatas precisam ser apuradas. Também já ocorreram denúncias de que o Ministério Público queria induzir um delator a denunciar determinados políticos, de forma a alterar a versão dos fatos, que seriam descritos como o promotor queria, e não como de fato teriam ocorrido. Há muita coisa sendo feita à margem da legalidade", afirma. 

Para o líder do PT na Câmara, deputado Paulo Pimenta (RS), que articulou o recolhimento das assinaturas, os deputados se "acovardaram" diante da pressão de grupos ligados a procuradores e juízes que comandam a operação e da opinião pública. Ele afirmou que espera que a instalação da CPI, que ainda depende do aval do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), aconteça nesta quarta-feira (20). 

"RELAÇÕES PROBLEMÁTICAS"

Lelo Coimbra, que é líder da maioria na Câmara, diz que assinou o requerimento para apuração de "relações que se mostram problemáticas" envolvendo delações premiadas. Ele citou o caso do ex-procurador Miller e ainda as colaborações do ex-senador Delcídio Amaral (PTC-MS) e do ex-diretor da Transpetro Sérgio Machado.

"Tem algumas conversas no Parlamento sobre como fazer um mecanismo de tirar essas inquietações para não fragilizar as delações. Quando assinei, foi nessa condição. Mas quando tomou forma (o requerimento para a abertura da CPI), foi tratado como se fosse uma ação anti-Lava Jato. Não sou contra a Lava Jato e tomei a decisão de retirar o nome. Trabalhamos para que o Rodrigo (Maia) desautorize o requerimento", afirma o emedebista.

Durante a tarde de hoje no plenário, o deputado Daniel Coelho (PPS-PE) cobrou Rodrigo Maia sobre o assunto na tribuna. O presidente da Câmara deu sinal de que pode engavetar o pedido: "Tudo que fazemos aqui será respeitando as leis. Ainda não li o teor, o mérito do documento. Mas fique tranquilo".

ANÁLISE

"Quando os deputados afirmam que assinaram o texto sem ler, é no mínimo uma irresponsabilidade, para não dizer que é uma inverdade. No fundo, houve esse recuo porque a opinião pública voltou-se contra a criação da CPI, e isso não pegou bem em ano eleitoral. Ninguém quer ser tachado como aquele que tentou barrar a Lava Jato.

A criação da CPI tem obviamente um componente de enfrentamento à Operação e à forma como os órgãos de investigação e o Judiciário encontraram para punir figuras importantes, como políticos e empresários, já que os crimes como o de lavagem de dinheiro são de difícil verificação.

O fato de haver denúncias de manipulação ou de um comércio de delações premiadas são pontuais, e isso não pode afetar um outro conjunto muito maior de delações bem-sucedidas. O próprio mundo jurídico tem a possibilidade de corrigir os eventuais excessos e equívocos. O mundo político, no fundo, quer fazer pressão no Judiciário. O presidente Rodrigo Maia possivelmente não vai entrar nesta bola dividida em ano eleitoral."

Rodrigo Prando, cientista político e professor da Faculdade Mackenzie

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(Com colaboração de Letícia Gonçalves)

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