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Especialistas analisam projeto anticrime de Moro

Especialistas analisam projeto anticrime de Moro

Texto traz mudanças em 12 leis e nos códigos Penal e de Execução Penal

Publicado em 5 de fevereiro de 2019 às 00:44

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Sérgio Moro durante a apresentação do pacote anticrime em Brasília. (Divulgação/Ministério da Justiça)

O chamado "pacote anticrime", apresentado pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, nesta segunda-feira (4), toca em questões importantes da legislação, em uma tentativa de maior combate à corrupção, aos crimes violentos e ao crime organizado, mas ainda vai precisar passar por um amplo debate, na avaliação de especialistas. 

Alguns pontos podem enfrentar mais resistência, já que envolvem discussões já realizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como a prisão após condenação em segunda instância, e normas endurecendo a progressão de regime. Desta forma, para os juristas, o caminho até a aprovação do texto pode ser complexo. 

CONFIRA AS ANÁLISES

Como será a operacionalização?

"O projeto representa um avanço para a redução da criminalidade. Podemos destacar, por exemplo, a situação dos crimes hediondos. Hoje, com dois quintos da pena cumprida, o detento pode pedir a progressão do regime e ir para o semiaberto, o que ajuda a reforçar o caráter da impunidade. Agora isto só acontecerá com três quintos da pena cumprida, ou seja, haverá um endurecimento, o que é mais assertivo. Também houve um endurecimento dos crimes com armas de fogo, criminalização do caixa dois, pacifica o debate jurídico e garante a prisão após julgada em segunda instância, o que ajuda a pôr fim ao prende e solta, com preso recorrendo das condenações e voltando para a liberdade. Outros pontos deveremos observar como será a operacionalização das medidas. O ministro Sérgio Moro reconheceu que o sistema prisional brasileiro está em crise. São 800 mil presos no Brasil para 300 mil vagas. É necessário um investimento no sistema prisional, com a construção de presídios e reformas de algumas unidades para aumentar o número de vagas. A situação do Espírito Santo preocupa, onde temos 1,6 preso por vaga, mas há estados com uma superlotação ainda mais crítica, com 4 detentos por vaga. Mas é preciso também investimentos no Poder Judiciário, para termos mais celeridade na avaliação dos processos, com incorporação de tecnologia de informação, digitalização dos processos, o que reduz o tempo das análises processuais. Hoje, o Estado conta com uma força-tarefa que está imbuída em qualificar melhor o sistema prisional, com o objetivo de focalizar os criminosos que cometem crimes com maior poder ofensivo. Este comprometimento pode ajudar a desafogar o sistema, com medidas alternativas, monitoramento eletrônico. Ações conjuntas, que vão acontecer em paralelo ao endurecimento das leis contra os crimes."

Pablo Lira - Professor do Mestrado de Segurança Pública da UVV

Pena menos severa, mas eficaz

"No curto prazo acredito que o projeto tende a piorar a superlotação carcerária, mas a situação pode mudar a médio e curto prazo dependendo de alguns fatores, como a redução das penas. O que pode ser obtido com uma das propostas do ministro Sérgio Moro, que está pondo em prática ou importando instrumentos já usados em outros países, como o plea bargain - acordo judicial -, que será muito importante, se for bem usado. O rigor da Justiça é maior com a imediatez da pena. É melhor ter pena menos severa, mas eficaz, fruto de um acordo, aplicada rapidamente, do que ter uma pena terrível e que demora muito a chegar. Marques de Beccaria assinalava que mais importante do que a dureza da pena é a presteza dela. E em geral estes presos, até cumprirem a pena, já cometeram outros crimes violentos. Agora, é uma proposta que vai enfrentar resistência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e também dos Direitos Humanos, por acreditar que entre outros pontos, acabará sendo aplicada com maior frequência entre as pessoas de menor poder aquisitivo. Em relação à prisão após condenação em segunda instância, avalio que vai depender da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o que deve acontecer nos próximos dias. Se ele julgar que a medida é inconstitucional qualquer mudança na legislação, incluindo as propostas por Moro, vão perder efeito. Outra polêmica é o regime nos presídios federais, que deixam de ter visitas íntimas. Encontros com parentes só nos parlatórios, com vidro separando, conversas por interfone, gravadas. Até a comunicação por carta teria leitura prévia. Regime adotado para crime organizado, em princípio, e facções."

Henrique Herkenhoff - Professor do Mestrado de Segurança Pública da UVV e ex-secretário de Segurança Pública

"Me parece que o ministro apresenta um projeto muito mais ambicioso do que de fato espera que seja aprovado, mas para poder ter uma margem de negociação com o Legislativo. Ele traz algumas alterações pontuais, como a criminalização do caixa dois, e outras que são estruturais no sistema, como o 'plea bargain', que em alguns casos, vai fazer com que ações penais não sejam iniciadas. Criminalizar o caixa dois não resolve, por si só, o problema, mas pode funcionar como um desestímulo. Fazer com que condenados por corrupção e peculato iniciem a pena em regime fechado também é algo que pode gerar debate, inclusive no Supremo, pois há o princípio constitucional que trata da individualização da pena."

Ludgero Liberato - Mestre em Direito e advogado criminalista

Novo governo, nova pressão

"O projeto legislativo do ministro Sérgio Moro propõe a alteração de institutos já consolidados da ordem jurídica brasileira, então não dá para afirmar que a simples mudança na lei irá cumprir esse papel de combate à corrupção. No meu entendimento, não precisamos de um número maior de leis, e sim, ver como elas serão aplicadas. Além disso, há muitos temas tratados no projeto que já haviam sido apresentados no Congresso, mas que ficaram parados. A diferença é que agora há um novo governo, uma nova forma de pressão, e também um novo Congresso. Alguns pontos podem não ter andamento, por já terem sido alvo de discussões no Supremo, como a impossibilidade de progressão de regime e a prisão após condenação em segunda instância."

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Ricardo Gueiros - Doutor em Direito e Professor da Ufes

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