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Advogados apontam argumentos frágeis na decisão sobre Temer

Advogados apontam argumentos frágeis na decisão sobre Temer

Para especialistas, juiz Marcelo Bretas não especificou motivos da prisão preventiva

Publicado em 23 de março de 2019 às 00:57

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Juiz federal Marcelo Bretas, da Lava Jato no Rio, mandou prender ex-presidente. (MARCOS ARCOVERDE/Agência Estado)

Em meio à expectativa sobre a manutenção ou não da prisão do ex-presidente da República Michel Temer (MDB), especialistas avaliaram que a decisão do juiz Marcelo Bretas não é robusta o suficiente para justificar o encarceramento do político. A medida do juiz federal do Rio de Janeiro abriu um debate jurídico. Juristas consultados apostam em habeas corpus em instâncias superiores.

Em que pesem as suspeitas sobre Temer, o caso ainda está sob investigação. A prisão dele não trata-se de cumprimento pena, mas de uma medida considera necessária à etapa investigatória, com base no previsto no artigo 312 do Código de Processo Penal.

Para ativação desse dispositivo, alguns requisitos devem ser observados: necessidade de garantir a ordem pública, a ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. A crítica de juristas deu-se exatamente sobre a ausência de detalhamentos do porquê o quadro de Temer se encaixaria em algum desses dispositivos.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, Marco Aurélio Florêncio observou que apenas três das 46 páginas da decisão versaram sobre os requisitos do artigo 312. “Pela análise apenas da decisão, não consigo chegar a esse juízo de valor, de que há essa densidade, pela excepcionalidade da medida e pela ausência de exposição especificamente sobre quais requisitos do 312 estavam sendo descumpridos”, frisou.

Ainda de acordo com Florêncio, a decisão de Bretas caminha muito mais no sentido de caracterizar autoria de crimes, em uma eventual condenação, do que no de justificar a prisão preventiva.

“A prisão preventiva é justificada com obstrução de provas, coação de testemunhas, quando o investigado ou acusado há risco de se evadir do local dos fatos. Meu receio é politizar o instituto da prisão preventiva para qualquer indivíduo que transgrida norma penal. Ao meu ver, há possibilidade de concessão de habeas corpus, com base na letra da lei”, frisou.

Para o advogado Henrique Zumak, a decretação de prisão preventiva é possível e necessária sempre que a avaliação indicar fatos concretos que a justifiquem. Contudo, observou que faltaram elementos robustos na decisão de Marcelo Bretas.

“O magistrado fala de fatos de 2011, 2012, 2014. Quando fala da contemporaneidade, remete ao ano 2017. Nenhuma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ratifica como contemporâneos fatos ocorridos há dois anos. Também há pontos em que fala de ‘possível’, de ‘tudo leva a crer’, isto é, fala com base em presunção e não sobre provas nos autos. Tampouco faz menção a destruição de provas. Não há menção a fuga do país ou sobre coação de testemunhas”, destacou.

O criminalista também ponderou que houve uma exposição exagerada do ex-presidente, um homem de 78 anos que acabou cercado por homens fortemente armados e preso em via pública.

“Estamos diante de atos sensacionalistas, pouco cautelosos, sem o devido cuidado ao processo legal e o respeito à dignidade da pessoa humana. Reduz-se a uma decisão longa e sem fundamentos concretos”, finalizou Zumak.

OUTRA PERSPECTIVA

Sem analisar especificamente o caso de Temer, o professor de Direito da FDV Felipe Teixeira Schwan lembrou que, na rotina da Justiça, prisões preventivas são decretadas “por muito menos”. “Não podemos esquecer da realidade da prisão preventiva e não criticar esse instituto porque o branco rico foi preso. O preto pobre sempre foi alvo, muitas vezes sem fundamentos. Crimes de lavagem de dinheiro são graves, afetam toda a população”, frisou.

O advogado e professor de Direito Dalton Morais destacou que a prisão preventiva só deve ser aplicada em casos em que as justificativas são concretas.

“Solto, continuaria a delinquir”, diz jurista

Para o jurista Wálter Maierovitchv, antes de verificar se houve ou não abuso de autoridade na prisão de Temer, deve-se analisar se os crimes apontados são aqueles considerados permanentes. De acordo com essa tese, a prisão seria necessária para estancar as irregularidades. O ex-presidente é apontado pelo Ministério Público Federal como “líder de organização criminosa” envolvida em crimes como corrupção lavagem de dinheiro.

“A lavagem de dinheiro e ocultação de capitais é crime permanente. O que seria isso? No crime permanente, a consumação vai se alongando no tempo, o crime continua ali. A situação de ilicitude se prolonga no tempo. Nesse caso, o ex-presidente Temer, Moreira Franco e coronel Lima estariam cometidos crimes permanentes”, disse o jurista em comentário à CBN.

Maierovitchv acredita que essa pode ter sido a tese encampada pelo juiz Marcelo Bretas. “Por todos esses elementos, à luz do Direito, a gente pode concluir que mantido solto ele (Temer) continuaria a delinquir, a interferir. E tudo graças ao seu prestígio político, agora com o título de ex-presidente. Daí há motivo para a prisão preventiva”, frisou o especialista.

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