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Crise no MEC atrasa chegada de livros e contratações no ES

Crise no MEC atrasa chegada de livros e contratações no ES

Falta de livros didáticos e de monitores está entre os problemas

Publicado em 27 de março de 2019 às 00:52

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Indefinições no Ministério da Educação afetam salas de aula pelo país, com falta de verbas e de direcionamento . (Shutterstock)

Entre demissões e mudanças repentinas envolvendo projetos e ações de cunho nacional, a crise interna que atinge o Ministério da Educação (MEC) já se tornou um problema para as escolas do Espírito Santo. Os impasses em Brasília vêm travando a continuidade de programas voltados para a alfabetização dos alunos e para a implementação da Nova Base Comum Curricular, que dependem de recursos federais para serem tocados. Em alguns locais, parte dos livros didáticos não chegou ainda.

O ano letivo foi iniciado em fevereiro, mas até agora as redes municipais de ensino ainda aguardam a contratação de monitores, que atuam como auxiliares dos professores nas turmas iniciais do ensino fundamental. O recurso é proveniente do programa nacional Mais Alfabetização, firmado entre os municípios e o MEC. Ele funcionou até o final do ano passado, mas não teve continuidade em 2019. Com isso, cerca de 19,5 mil crianças nesta faixa de ensino já são afetadas na Grande Vitória.

Em poucos dias, a secretaria executiva do MEC passou por três mudanças. Após o desligamento do secretário Luiz Antônio Tozi (demitido com outros seis secretários e diretores do ministério), o ministro Ricardo Vélez Rodríguez anunciou que o cargo seria assumido por Rubens Barreto da Silva. O nome nem chegou a ser publicado no Diário Oficial e já foi substituído pelo de Iolene Lima, que também já não ficará com a vaga.

No vaivém de ações, que ora são anunciadas, ora são descontinuadas, a última polêmica aconteceu na segunda-feira, quando o Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (Inep) oficializou o adiamento da prova de avaliação da alfabetização para 2021. Ela estava prevista para este ano. A medida resultou na demissão voluntária da secretária de Educação Básica, Tania Leme de Almeida, e custou a cabeça do próprio presidente do Inep, Marcus Vinícius Rodrigues. Mas 24 horas depois, o adiamento da avaliação foi revogado por Vélez Rodríguez.

FALTAM ATÉ LIVROS

Em Vila Velha, onde 49 escolas são cadastradas no Mais Alfabetização, 8 mil alunos estão sendo prejudicados pela falta dos recursos. Há ainda outros problemas. “Muitas escolas ainda não receberam os livros didáticos que teriam de ter recebido nesse período”, pontuou a prefeitura.

A preocupação é evidente na fala do secretário de Educação de Cariacica, José Roberto Martins Aguiar. Lá, cerca de 6 mil crianças na faixa de seis e sete anos estão sendo afetadas pelas falhas no Mais Alfabetização. Parte dos livros que deveriam chegar para a alfabetização e outras séries também está em falta. O atraso no início dos anos letivos é comum, mas este ano ele vem extrapolando o limite de tempo.

“Toda essa briga ideológica do MEC tem prejudicado os municípios. Além do diagnóstico dos alunos que esse programa fornece, o auxílio financeiro é muito importante. A base aprovada no ano passado antecipa a alfabetização e as políticas precisam ir em convergência a ela, o que não está acontecendo, pois não há investimentos”.

As prefeituras de Vitória e a da Serra (onde parte dos livros também não chegou) informam que aguardam o MEC para seguir com o Mais Alfabetização.

BASE CURRICULAR

A paralisação do MEC também atinge o Programa Nacional de Apoio à Implementação da Base Nacional Comum Curricular (ProBNCC), criado para apoiar Estados e municípios a elaborar e implementar seus currículos conforme a nova base. O MEC garantiu o pagamento de até 31 bolsas por Estado no valor de R$ 1.100,00 cada uma em 2018 e 2019.

Mas, segundo reportagem de “O Globo”, em um ofício enviado aos secretários estaduais e dirigentes municipais de Educação, o Ministério informou a suspensão da continuidade dos pagamentos.

A Sedu não divulgou dados mais detalhados sobre o assunto, mas a insatisfação com a descontinuidade de programas foi manifestada pelo secretário estadual de Educação, Vitor de Angelo, ao colunista Vitor Vogas. Segundo ele, 17 escolas estaduais serão piloto na implantação da nova base para o ensino médio.

“Existe um programa de apoio aos Estados para a estruturação do novo ensino médio. Isso está parado. Só que o prazo está correndo. Então é algo muito sério”.

De acordo com De Angelo, assim como as políticas educacionais, a entrega de recursos também está parada. “(O MEC) Não liberou recursos para livros, recursos para capacitação, recursos para consultores. Recursos para agendas que são específicas para este momento, agendas novas, e por mais que a gente tenha esforço e boa vontade de tomar a frente, não dá para fazer sozinho. Inclusive porque o MEC tem o papel de coordenação das políticas nacionais”, criticou.

EDUCADORES TEMEM RETROCESSOS EM MEIO A GUERRA IDEOLÓGICA

A disputa ideológica que divide o Ministério da Educação (MEC) entre militares, discípulos de Olavo de Carvalho (filósofo e conselheiro do presidente Jair Bolsonaro), evangélicos e membros da equipe técnica da pasta vem resultando na paralisação de programas e é vista com preocupação por educadores. O temor é por retrocessos em uma área considerada fundamental para o desenvolvimento do país.

Aspas de citação

Não foi apresentado um projeto de governo para a educação. As ações são pensadas momentaneamente

Cleonara Schwartz, professora da Ufes
Aspas de citação

Na avaliação da doutora em Educação e professora da Ufes Cleonara Schwartz, até o momento o MEC não apresentou um projeto de Educação consolidado, apenas ações momentâneas e sem planejamento. O resultado disso é a “insegurança administrativa”.

“Qualquer interrupção de políticas gera impactos para a organização dos municípios e para os Estados. Houve, por exemplo, um investimento público para a organização da Base Nacional Comum Curricular e todos já estavam se mobilizando em torno de ações. Mesmo com todas as fragilidades do governo anterior algo estava caminhando”, critica.

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Eles têm que definir quem será o secretário executivo, que é quem opera a máquina da educação no MEC

Cláudia Costin, professora da FGV
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A diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV/EBAPE, Cláudia Costin, ressalta que embora Estados e municípios sejam independentes do governo federal em muitos aspectos, há outros em que não há como se trabalhar sem parcerias que são vitais para a qualidade da educação, como a formação de professores, a avaliação do desempenho dos alunos e a implementação da nova base curricular.

“Esse é um ano de implementação do currículo na educação infantil e no ensino fundamental. Já no ensino médio, é um ano de tradução desse currículo, de formação dos itinerários formativos, e isso pode ajudar a dar um salto na educação se for bem feito”, pontua a professora.

No entanto, Cláudia se diz preocupada com o ritmo lento com o qual as ações vêm sendo tocadas. “Ficamos preocupados porque a educação não pode esperar. Cada ano na vida de uma criança é muita coisa”.

Ela continua: “Se olharmos para os resultados educacionais, vemos melhorias lentas do quinto ao nono ano e o ensino médio está estagnado. Esperamos que o ProBNCC (programa que está paralisado) melhore isso, mas o MEC está marcando passo”.

Para Cleonara, este seria, por exemplo, o momento de se chamar os especialistas e profissionais da educação básica para rediscutir a nova base curricular, que ainda gera dúvidas e críticas. No entanto, isso não tem acontecido.

Cláudia, por sua vez, aponta saídas para avanços. “Eles têm que definir quem será o secretário executivo, que é quem opera a máquina da educação no MEC. Também é urgente dar atenção para a Secretaria de Educação Básica”, diz.

RAIO-X

Hino Nacional

Filmado nas escolas

Em fevereiro, o MEC orientou que responsáveis por escolas executassem o Hino Nacional e filmassem as crianças. Após uma chuva de críticas de educadores e juristas, a orientação foi desfeita.

Dança das cadeiras

Demissões em série

Em 12 de março, o secretário executivo do MEC, Luiz Antônio Tozi, foi demitido pelo ministro Ricardo Vélez, após reuniões com Jair Bolsonaro. Outros seis diretores e secretários foram demitidos.

Vaivém

De sucessores ao cargo

Para substituir Tozi, Vélez anunciou o nome de Rubens Barreto da Silva, que depois foi trocado por Iolene Lima. Mas ela foi demitida no dia 14.

Prova da alfabetização

Adiada pelo Inep

Em 25 de março, o Inep adiou a prova que avalia a alfabetização para 2021. Ela ocorreria este ano. Insatisfeita, a então secretária de Educação Básica, Tania Leme de Almeida, demitiu-se.

Novo recuo

Nesta terça-feira (26), uma nova portaria anulou o adiamento. O presidente do Inep foi demitido.

Disputas internas

Geram paralisação

O resultado dos atritos são a paralisação de programas nos Estados, como o Mais Alfabetização e o ProBNCC.

PROFESSOR QUE ATUOU NO ES ACUMULA FUNÇÕES

Ex-aluno do ministro da Educação Ricardo Vélez Rodríguez, Alexandro Ferreira de Souza assumiu, nesta terça-feira (26), a Secretaria de Educação Básica. Secretário de Educação Profissional e Tecnológica na pasta, ele vai acumular as duas funções.

Souza possui formação em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e, já na graduação, teve a orientação de Vélez para o trabalho “A Tragédia Ática: Entre o Mito e a Filosofia”. Ele tem mestrado e doutorado em Ciência da Religião pela mesma instituição.

Antes de ir para o MEC, Souza atuava como professor da Secretaria de Educação do Espírito Santo.

Há duas semanas, o MEC vem sofrendo uma série de demissões por conta de disputas internas dentro da pasta. Há dificuldade em encontrar novos nomes para assumir os cargos vagos.

Luiz Antonio Tozi, que ocupava o cargo de secretário executivo, foi demitido há 15 dias a pedido do presidente Jair Bolsonaro. Ele, que é ex-dirigente do Centro Paula Souza, faz parte do grupo técnico do ministério que tem rivalizado com os simpatizantes de Olavo de Carvalho, considerado o guru dos bolsonaristas.

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Na semana passada, Iolene Lima, que era diretora de formação e muito próxima de Tânia, foi demitida. (Âgência Estado)

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