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Desgaste entre Bolsonaro e Maia vai além de uma 'chuva de verão'

Desgaste entre Bolsonaro e Maia vai além de uma "chuva de verão"

Tensão entre poderes atrapalha articulação

Publicado em 29 de março de 2019 às 01:58

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Jair Bolsonaro durante a entrega do texto da reforma da Previdência a Rodrigo Maia, em fevereiro. (Marcos CorrÍa/PR)

Com menos de 100 dias de mandato, o desgaste entre o governo Bolsonaro e o Congresso Nacional foi intensificado esta semana, com a troca de farpas entre o presidente da República e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM). Houve ainda a falta de habilidade demonstrada pelos ministros do Executivo em suas idas – ou ausências – ao Legislativo.

As dificuldades de relacionamento têm levado a condução política a um caminho arriscado, correndo o risco de afetar as agendas que têm a votação aguardada para este ano, como a reforma da Previdência, por exemplo, na avaliação de analistas e parlamentares.

Manifestações do próprio Bolsonaro e de seus líderes atrelando a cobrança por diálogo, feita pelos parlamentares, à “velha política”, estão no centro das insatisfações.

O presidente começou com essas afirmações há duas semanas, após ter se reunido com Maia para tratar da Previdência, e no mesmo dia em que anunciou a liberação de R$ 1 bilhão em emendas parlamentares. O presidente da Câmara, por sua vez, alertou Bolsonaro da necessidade de melhorar a articulação com o Congresso Nacional, que vinha se sentindo desprestigiado.

Daí em diante, a corda só passou a ficar mais esticada, até que, na última quarta-feira, em tom de ironia, Bolsonaro afirmou que Maia estaria “um pouco abalado com questões pessoais que vêm acontecendo”. O parlamentar rebateu, dizendo que o capitão estava “brincando de ser presidente”.

Ontem, em uma tentativa de trégua, ambos abaixaram o tom. “Para mim isso foi uma chuva de verão. O Brasil está acima de todos. Vamos em frente. Página virada”, afirmou o presidente. Maia, após almoçar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, também sinalizou. “Vamos colocar esse trem nos trilhos para que a gente possa caminhar com velocidade”, disse.

O fato de Guedes não ter comparecido à reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), nesta semana, na Câmara, foi inclusive um elemento que contribuiu para a exaltação dos ânimos. No entanto, há um compromisso de que o ministro cumpra esta agenda na próxima quarta-feira.

ESTACA ZERO

Daqui em diante, é importante que o Planalto se empenhe em reiniciar uma operação contra a crise política, com mais interlocutores e congressistas, na tentativa de viabilizar projetos estratégicos ao governo, na avaliação do cientista político Fernando Pignaton.

“Bolsonaro, na viagem aos Estados Unidos, entrou em uma imersão ideológica que o fez tomar atitudes que o tiraram da articulação e o fez perder a hegemonia internamente. Setores mais moderados estão dando um passo atrás”, afirma.

Para ele, está se manifestando um movimento novo no setor da direita. “Este grupo, que estava tão à vontade no período eleitoral e escolheu Bolsonaro como ícone, ao chegar no governo se depara com outra realidade e vai se dividindo em correntes. Há os grupos dos liberais, dos militares e do guru Olavo de Carvalho, e ainda o de centro-direita, e do centrão, que estão se organizando em torno de Rodrigo Maia”, comenta.

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O governo precisa descer do salto e se dispor a conversar. A reforma é um pacotão muito complexo

Felipe Rigoni (PSD), deputado federal
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O cientista político Carlos Melo também destaca a inexperiência de Bolsonaro e das lideranças que o cercam. “Estamos em uma longa transição, em que Bolsonaro e seu partido se organizaram no contexto da crise, sem experiência. Mas era preciso um crescimento rápido. Sair do campo das emoções e discutir projetos”, disse, à rádio CBN.

O deputado federal Felipe Rigoni (PSB) também considera que a divisão interna é um dos fatores que agrava a interlocução.

“O presidente se elegeu com as alas dos conservadores nos costumes, com os da pauta econômica e com os militares. Essa ala conservadora reforça a negação da política. O que percebemos é que como Bolsonaro não se preparou para ser presidente, está tudo desorganizado, o governo não senta para conversar. E isso não significa que é toma lá, dá cá”.

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Conversar não quer dizer se vender. É usar o convencimento. O Poder Legislativo não tem obrigação de encabeçar nada

Sérgio Vidigal (PDT), deputado federal
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Para Sérgio Vidigal (PDT), o trabalho de convencimento está falho. “Há muitos fatores. Falta de experiência, renovação grande, ministérios com dificuldade de relacionamento. Vejo que o problema maior que ele está tendo é com aqueles que o apoiaram: o centrão, o próprio partido dele. Conversar é uma tarefa natural de um líder”, afirma.

POLÊMICAS

20 de março

Maia x Moro

Uma declaração de Rodrigo Maia sobre Sérgio Moro foi o gatilho para desentendimentos entre os Poderes Executivo e Legislativo. Maia disse que o projeto anticrime do ministro é um “copia e cola” de uma proposta do antecessor na pasta, Alexandre de Moraes.

23 de março

Maia x Carlos Bolsonaro

Após ser criticado por Carlos Bolsonaro no Twitter, Maia disse ao ministro Paulo Guedes que, se é para ser atacado nas redes sociais por filhos e aliados de Bolsonaro, o governo não precisa de sua ajuda.

A reação

Bolsonaro afirmou que não entra em campo de batalha que não é o seu, que algumas pessoas “não querem largar a velha política”, e jogou a responsabilidade da reforma da Previdência sobre Maia e o Congresso, não sabendo porque ele anda tão “agressivo”.

27 de março

Novo embate

O presidente afirmou que Maia está “abalado por problemas na vida pessoal”. Para o líder do Executivo, parlamentares estão fazendo “tempestade em copo d’água”.

Réplica

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“Abalados estão os brasileiros que esperam desde janeiro que o Brasil comece a funcionar”, afirmou Maia, rebatendo o presidente.

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