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Oposição? Polícia Federal? Que nada. Bolsonaro cria os próprios problemas

Oposição? Polícia Federal? Que nada. Bolsonaro cria os próprios problemas

Especialistas avaliam que o presidente deveria estar focado em agendas econômicas e sociais importantes, que são necessárias para retomada de empregos e queda da desigualdade

Publicado em 6 de março de 2019 às 21:54

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A oposição fala em representar criminalmente contra o presidente, um aliado vem a público criticar a postura do chefe de Estado e o jurista responsável por encaminhar a tese que culminou na queda de Dilma Rousseff (PT) avalia que a publicação de um vídeo com ato obsceno, pelo presidente da República, pode ensejar a abertura de um processo de impeachment. Nova crise está instalada, é fato. O que causa espécie, porém, é a origem da nova tormenta sobre o governo Bolsonaro. Não veio a reboque de nenhuma grande operação da Polícia Federal (PF) ou por ação organizada dos antibolsonaristas, mas dos dedos tuiteiros do próprio presidente – ou do filho Carlos Bolsonaro, o suposto responsável por publicações do pai nas redes sociais.

No Twitter, Bolsonaro tem mais de 3,5 milhões de seguidores. (Reprodução)

Na avaliação de especialistas, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) deveria estar focado em agendas econômicas e sociais importantes, aquelas necessárias para retomada de empregos e queda da desigualdade. Mesmo que fosse criticar o carnaval, poderia (e deveria) ter feito de outa forma. É fácil concluir que não é razoável usar o comportamento isolado de dois indivíduos para estigmatizar um evento tradicional que gera emprego, promove o turismo, movimenta quase R$ 7 bilhões e – por que não? – possibilita um pouco de alegria para um povo que faz por merecer, apesar de tudo.

O vídeo publicado por ele é um sinal de que o presidente ainda não desceu do palanque eleitoral, na avaliação do professor de Sociologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie Rogério Baptistini.

"Essa tendência de se manifestar diuturnamente pelas redes sociais gera crises continuadas para seu governo. Gera muito barulho. No caso em questão, o presidente não só manifestou uma opinião com extremo mau gosto, como também não levou em conta a posição que ele ocupa, a posição institucional, de presidente da República. Esqueceu o ponto de vista econômica do carnaval, que movimenta a economia, que traz turistas. Gerou uma repercussão imediata e mundial, que pode trazer prejuízos", disse.

Mais um indício do equívoco está no isolamento do ato polêmico. Governadores de Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e outros Estados com alguma tradição carnavalesca não reduziram os dias de festa aos imprevistos de sempre. Também não há registros de que prefeitos das principais capitais do carnaval tenham se queixado, mesmo cabendo a eles providenciar estrutura e pessoal extra para acolher os foliões.

"O presidente fez acrescentar, nesses primeiros dias de governo, mais um episódio grotesco, típico de republiqueta, de país desinstitucionalizado, sob liderança de um destemperado. Isso vai corroendo a legitimidade que ganhou nas urnas e pode prejudicar a base para apoio a reformas. O presidente está alimentando crises. Parece não ter noção do seu papel", frisou Baptistini.

No Twitter, Jair Bolsonaro tem 3,5 milhões de seguidores. Os três filhos dele têm cerca de 1 milhão, cada um. Para o professor de Ciência Política da PUC-Rio Ricardo Ismael, os canais seriam melhor utilizados se o clã, por exemplo, focasse em explicar a reforma de Previdência.

"Certamente o país tem outros problemas, questões mais urgentes. Essa crítica que ele fez deve ter o apoio de algumas pessoas incomodadas com excessos no carnaval de rua, mas podia ser feita de uma forma que não aquela utilizada. Cria-se uma discussão por alguns dias, enquanto o Brasil precisa debater alguns problemas concretos. Os problemas estão todos aí, como o desemprego e o baixo desempenho econômico. Tenho dúvida se isso não nos traz mais prejuízos do que benefícios, mas isso só o tempo dirá", pontuou.

ESTRATÉGIA ELEITORAL NO GOVERNO

Nos blocos de rua ou nos desfiles das grandes escolas de samba, Jair Bolsonaro e as ideias que ele defende foram amplamente criticados. O vídeo obsceno pode ter sido para atacar quem o ataca, estratégia que condiz com a maneira como ele se portou na campanha eleitoral. É como avalia Sergio Denicoli, diretor da AP/Exata e pós-doutor em comunicação digital.

"A postura do presidente é bastante coerente com o que vimos na campanha eleitoral. Uma vez atacado por blocos de carnaval e foliões, ele reagiu, buscando um fato isolado negativo, como forma de generalizar algo. Isso ocorreu em diversos momentos da corrida à Presidência. É uma estratégia clara de tentar denegrir quem o ataca", frisou.

Além do vídeo, Bolsonaro publicou, na manhã desta quarta-feira (06), uma pergunta incompatível com o cargo que ocupa, e que colocou mais gasolina na polêmica.

"Golden shower" é o nome em inglês para o fetiche de urinar na frente de um parceiro ou sobre ele. Se Bolsonaro quisesse mesmo saber o significado, uma simples busca no Google sanaria a dúvida.

"Parece não ser uma estratégia, mas apenas um impulso de quem ainda não percebeu que a voz que ecoa simboliza a nação, por ser ele o representante máximo dos brasileiros. Ao questionar algo que ele poderia ter sabido o que era numa busca rápida no Google, por exemplo, o presidente revela um lado impulsivo, que não condiz com a necessidade de reflexão de um presidente ao se manifestar publicamente sobre o que quer que seja", destacou Denicoli.

Há quem suspeite que publicações como essa sobre o carnaval são tática de Bolsonaro para lançar cortina de fumaça para outros problemas mais graves e desgastantes ao presidente e ao governo. Sergio Denicoli discorda.

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"Não acredito que esse seja o objetivo, mesmo porque o presidente acredita nos projetos que tem enviado ao Congresso e precisa, inclusive, do apoio popular para pressionar os parlamentares a aprová-los. O que está claro é que Jair Bolsonaro ouve o que as redes sociais dizem e acompanha todos os movimentos on-line que envolvem a ele e ao seu governo. Portanto, diante de ataques que sofreu, reagiu de forma a tentar descredibilizar e colocar no mesmo barco os que o criticaram nos dias de folia", disse.

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