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Eleitores de direita no Espírito Santo já fazem críticas a Bolsonaro

Eleitores de direita no Espírito Santo já fazem críticas a Bolsonaro

Despreparo técnico e diálogo falho preocupam parte do eleitorado que apostou no capitão da reserva para presidir o país pelos próximos quatro anos

Publicado em 20 de junho de 2019 às 21:06

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Jair Bolsonaro tomou posse em janeiro para presidir o país pelos próximos quatro anos. (Antonio Cruz/ABR)

Para muitos eleitores que se identificam à direita, votar em Jair Bolsonaro (PSL) era a única opção viável em 2018.

Convencidos pela mobilização política das ideias mais liberais para a economia, ou movidos por uma onda de contágio na esperança de mudança radical, a expectativa popular estava alta.

No entanto, a quase sete meses do início da gestão, não é difícil encontrar manifestações de quem se diga contrário a algumas medidas tomadas pelo presidente.

O foco do descontentamento não é por seus projetos ou pela agenda do governo, que não pode ser considerada surpreendente, e sim alinhada ao discurso da campanha eleitoral.

Mas a postura do presidente, a falta de habilidade para o diálogo e para fazer política, e as manifestações de despreparo técnico já preocupam parcela desta direita, que mesmo não-convicta ao bolsonarismo, o apoiou.

Este movimento já é uma realidade entre importantes atores da direta nacional. O Movimento Brasil Livre (MBL), grupo de jovens que, desde 2014, manteve uma atuação forte nas redes sociais em favor do impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), e apoiou Bolsonaro em 2018, já mudou de discurso.

Uma das lideranças do grupo que se elegeu, o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), adotou um tom crítico ao governo.

O MBL, inclusive, se posicionou contra as últimas manifestações, em maio, que eram a favor de Bolsonaro. "É uma manifestação com tom autoritário, de fechamento de Congresso e Supremo, governista. O mote principal é 'nós apoiamos Bolsonaro e tudo o que ele fizer, incondicionalmente', o que não é do nosso ideal defender esse tipo de adesismo", declarou Kim.

Ele também foi alvo dos apoiadores do presidente nas redes sociais. "Estão me chamando de comunista. Essa é a definição histórica de comunismo, discordar do Bolsonaro. É um discurso do Olavo de Carvalho demonizar qualquer pessoa que discorde do discurso dele", afirmou.

O tom radical de Olavo, e dos filhos do presidente – em especial, Carlos – e a grande influência concedida a eles é outro fator de descontentamento.

O cantor Lobão, que se tornou uma das vozes mais ativas da direita nos últimos anos, classificou, nas últimas semanas, o governo como um "desastre".

"Carlos Bolsonaro tem problemas emocionais sérios, e Eduardo não sabe lidar com a base parlamentar. Os filhos do Bolsonaro estão criando um clima horroroso. E é óbvio que o Olavo vai acabar com esse governo, porque ele é uma pessoa muito autodestrutiva", disse, em entrevista.

POPULAÇÃO

A esperança projetada sobre Bolsonaro também tem se convertido em desapontamento para aqueles eleitores que se motivaram pelo desalento econômico.

De acordo com o último levantamento do Ibope, 19 milhões de eleitores que votaram no capitão da reserva já não avaliam o governo positivamente. Entre eles, 1,8 milhão considera ruim ou péssimo.

O resultado se deve, principalmente, à dificuldade do governo em fazer a economia voltar a crescer e de reverter o desemprego.

A esteticista Rosângela Nunes, de 47 anos, afirma que mesmo Bolsonaro não sendo a opção ideal, o escolheu por considerar que alguma mudança era necessária, e ele, ao menos, colocaria ordem na casa.

"Estou decepcionada, ele não se porta como presidente. Em um país violento, e em crise como o nosso, essas trapalhadas dele só prejudicam, e não estão vindo com mudanças concretas na vida da população", considera.

O engenheiro Celso de Jesus, de 61 anos, se preocupa com a falta de habilidade, mas ainda é cauteloso. "Ainda acho que está cedo, mas ele precisa melhorar. Precisa agir de acordo com o tamanho da cadeira em que está sentado", afirmou.

Especialistas alertam para melhoria na comunicação

A parcela de pessoas que apoiaram o bolsonarismo e hoje já se dizem descontentes, decepcionadas ou arrependidas de sua escolha demonstra que vai ser essencial que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) passe a controlar os ruídos de seu governo, a aprimorar a forma de se comunicar com a população e com os setores da sociedade, e também pare de criar crises desnecessárias, na avaliação de especialistas ouvidos pelo Gazeta Online.

Do contrário, tais críticas, que já vêm também da própria direita, podem evoluir nos próximos meses do governo e acabar se revertendo em uma perda de apoio e uma oposição propriamente dita.

A cientista política e professora Ariane Roder, da Coppead/UFRJ, pontua que pessoas que apoiaram Bolsonaro como uma forma de negação ao projeto do PT são aquelas que estão mais propensas a "pular do barco" primeiro, já que não tinham uma adesão completa à agenda do capitão da reserva.

Mesmo que Bolsonaro sempre tenha deixado claro seu perfil, muitos acreditavam que sua postura mudaria ao chegar ao Palácio do Planalto.

"O eleitor que não é bolsonarista esperava que fosse haver uma aproximação mais ao centro, tanto às pessoas como às ideias, para tentar fazer uma coalizão majoritária. Porque um governo que é extremo tem dificuldade de construir maioria no Congresso. Ele ainda tem demostrado inabilidade. Continua com um discurso muito inflamado, como se ainda fosse candidato, e permite muita interferência dos filhos, que traz ainda mais ruídos para a relação com o Legislativo", analisa Ariane.

Assistindo a uma crise política contínua e uma economia que não registra melhora, a avaliação do governo não registrou bons resultados neste início do ano.

Nos três primeiros meses da gestão, ele obteve a pior avaliação entre presidentes de primeiro mandato, de acordo com o levantamento feito pelo Datafolha, em abril. Segundo o instituto, 30% dos brasileiros consideravam o governo de Bolsonaro ruim ou péssimo naquele momento.

Para o doutor em Ciências Sociais e pesquisador da direita brasileira, Pablo Rosa, a influência do olavismo também é um grande mal do grupo.

Olavo de Carvalho é um filósofo e ideólogo que vive nos Estados Unidos e é apontado como guru de Bolsonaro. Ele já foi, inclusive, responsável pela indicação de ministros e de importantes cargos no Ministério da Educação (MEC).

"Ele é extremamente influente e tem um projeto de poder que se alimenta desse caos. Acredita nessa radicalização contra o establishment, representado por imprensa, Congresso e militares. O olavismo para Bolsonaro é uma máquina de populismo virtual, que alimenta seus seguidores mais convictos. No entanto, o cidadão vê tudo isso de forma negativa, não concorda com esse prestígio dado ao escritor", disse.

O PARTIDO

O cientista político e professor da PUC-Rio Ricardo Ismael menciona que outro fator de enfraquecimento do governo é a pouca coesão que há dentro do PSL, partido do presidente.

"O senador Major Olímpio briga com a líder, deputada Joice Hasselmann, o deputado Alexandre Frota fala mal do presidente... o PSL está se mostrando muito dividido, com egos muito grandes, e demonstrando que está pensando pouco em ajudar Bolsonaro. Isso deixa as pessoas inseguras, faz o governo perder a confiança", analisa.

Os insatisfeitos

Kim Kataguiri (DEM-SP)

Líder do MBL e deputado federal

Kim Kataguiri. (Reprodução/Instagram)

O grupo, que foi um dos principais mobilizadores do impeachment de Dilma, também mergulhou de cabeça na campanha de Bolsonaro no 2º turno. Hoje, para Kim, o presidente erra ao pregar discurso de demonização da política.

Lobão

Cantor

Lobão. (Rafael Melo)

Uma das vozes mais ativas da direita, Lobão defendeu Bolsonaro abertamente nas eleições. No entanto, no mês passado o chamou de "psicopata", e que o governo é um "desastre".

Delfim Netto

Economista

Delfim Netto. (Fecomércio SP/Flickr)

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Ex-ministro da Fazenda que atuou durante o regime militar apoiou a eleição de Bolsonaro, mas recentemente tem feito críticas. "A falta de simpatia do governo pelo conhecimento é trágica", afirmou.

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