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Governo quer limitar pagamento de supersalários a servidores

Governo quer limitar pagamento de supersalários a servidores

Proposta do Ministério da Economia estuda limitar a remuneração à média salarial do setor privado

Publicado em 8 de junho de 2019 às 00:52

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O ministro da Economia, Paulo Guedes, e sua equipe, estudam alterações para frear supersalários. ((Windows))

Uma proposta de limitar os salários acima do teto constitucional, os chamados supersalários, pagos ao funcionalismo público, está sendo estudada pelo Ministério da Economia. A ideia é que a remuneração fique limitada à média salarial de funcionários que exercem função semelhante no setor privado.

A informação é da colunista Mônica Bergamo, da "Folha de S. Paulo". De acordo com o relatório do Banco Mundial de 2018, a folha de pagamento do setor público brasileiro consome em torno de 13% do PIB, fatia alta para padrões internacionais.

E ao considerar experiências profissionais e formações acadêmicas similares, e comparando carreiras nos setores público e privado, o estudo estimou que os salários são em média 96% mais altos no nível federal e 36% mais altos no nível estadual quando comparados ao setor privado. Somente os salários municipais estão, em média, alinhados com os equivalentes no setor privado.

O governo ainda não detalha de que forma esta equiparação entre o público e o privado seria posta em prática. O Ministério da Economia foi procurado, mas não comentou sobre a proposta.

Especialistas consultados pelo Gazeta Online defendem que as distorções provocadas pelos supersalários precisam ser enfrentadas e debatidas, mesmo que a nova proposta da equipe do ministro Paulo Guedes não prospere.

Isso porque dada a grande parcela do gasto público dedicada à folha de pagamento, nenhum ajuste fiscal será bem-sucedido sem um controle do crescimento salarial do setor público, como aponta o economista e representante da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco.

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Enquanto o setor privado enfrentou muitas dificuldades econômicas no auge da recessão econômica, em 2016, e trabalhadores e empresários tentavam a duras penas manter os empregos, tendo inclusive fazer cortes ou reduzir remunerações, presenciamos um festival de reajustes escalonados para servidores públicos federais durante quatro anos. Além disso, em janeiro deste ano, o enorme reajuste dado aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), elevando o teto constitucional, trouxe um efeito cascata de aumento de gastos para o país todo. Há muita discrepância

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Ele também destaca que há inúmeras variantes legais e interpretações jurídicas que garantem supersalários, além dos reajustes. A fórmula para multiplicar a remuneração acima do teto é rechear o contracheque com indenizações, gratificações, verbas retroativas e abonos, que não se submetem ao teto constitucional.

O resultado disso é que hoje quase 70% dos servidores públicos federais estão entre os 10% mais ricos da população na distribuição de renda.

OS SUPERSALÁRIOS

- O que são?

Os chamados “supersalários” ocorrem quando as remunerações dos servidores públicos ultrapassam o limite máximo a ser pago ao funcionalismo, que equivale ao teto estabelecido pela Constituição Federal.

- O teto salarial

Pela Constituição, nenhum funcionário público pode receber acima do teto, que é igual aos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que é R$ 39.293,32.

- Mecanismo

As verbas recebidas no serviço público podem ser remuneratórias ou indenizatórias. Caso as remuneratórias ultrapassem o valor do teto, incide o chamado “abate-teto”, que desconta o valor excedente. 

- Indenizações

Há hoje diversos tipos de pagamentos que são consideradas verbas indenizatórias, e não se submetem ao corte do abate-teto, nem sofrem desconto da Previdência e do Imposto de Renda. Entre elas, benefícios como o auxílio-alimentação, auxílio-saúde e auxílio-moradia.

- Beneficiados

Servidores de carreiras que já ganham salário próximo ao teto, como auditores fiscais, juízes e promotores, por exemplo

DESIGUALDADE

Castello Branco também pontua que dentro do próprio setor público existe uma grande desigualdade salarial, principalmente levando em conta rendimentos dos Poderes Legislativo e Judiciário.

"Temos também salários muito baixos, como de policiais, professores e médicos. Vemos que isso não é decidido pelo mérito da função, mas por classes que têm mais influência na Câmara e no Senado. Estamos falando de pessoas que recebem mais de R$ 100 mil por mês", afirma.

Dados de um estudo do Ipea, do final de 2018, mostram que na esfera estadual, os membros e servidores do Executivo ganham, em média, 40% das remunerações do Judiciário e 51% dos salários do Legislativo.

Nesse contexto, economistas defendem a necessidade de reformas estruturais, a começar por adequar a remuneração de entrada às práticas do mercado. É o que destaca a doutora em Economia e professora da Fucape, Arilda Teixeira.

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O salário começa alto e a progressão se torna lenta. Para compensar, criaram-se uma série de benefícios, que não são tributados e nem respeitam o limite. Além disso, como as progressões são automáticas, não há um incentivo para o servidor manter alto nível de desempenho. Os acréscimos salariais deveriam ser decorrentes da meritocracia, assim como ocorre no setor privado.

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Adiar reajustes previstos, tendo em vista a situação orçamentária, também poderia frear esse tipo de gasto, conforme Arilda.

Ela acrescenta que é preciso simplificar as carreiras e consolidar as negociações salariais com um número menor de grupos, já que hoje cada carreira negocia separadamente suas progressões salariais e benefícios, complicando a definição de políticas consistentes para remuneração.

Entidades de servidores criticam proposta

A complexidade para estabelecer parâmetros de uma média salarial dos funcionários públicos, comparados ao setor privado, para evitar os supersalários, é alvo de críticas e questionamentos por parte de associações de classe que representam esses servidores.

Elas questionam a viabilidade da proposta que está em estudo pela equipe econômica do governo federal. Entre as carreiras em que é mais comum que os salários ultrapassem o teto constitucional, por já possuírem uma remuneração muito próxima ao limite, de R$ 39,2 mil, e por contarem com uma série de benefícios e bonificações, estão as dos magistrados, membros do Ministério Público e Tribunal de Contas, procuradores e auditores da Receita.

O presidente da Associação dos Procuradores do Estado do Espírito Santo (Apes), Leonardo Pastore, classificou a ideia como uma discussão rasa no contexto do problema dos gastos com pessoal.

"Como o governo vai calcular os valores de referência para chegar à média dos salários no setor privado? Vai considerar benefícios que eles possuem, como FGTS, participações nos lucros? Corre-se o risco de chegar a uma média mais baixa que o real, ou mais alta. Além disso, os regimes de contratação e de contrato de trabalho entre o setor público o privado são diferenciados, e isso deve ser levado em conta".

Ele acrescenta que é importante que o serviço público ofereça bons salários. "Conforme a natureza de cada cargo, as remunerações não podem ser tão baixas, que desprestigiem as funções públicas. E ainda para se ter as pessoas mais capacitadas para ocupar o cargo, que tenham a intenção de ficar nele por um longo prazo, para que haja a continuidade do serviço público", afirma.

O presidente da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages), Daniel Peçanha, também apontou que haveria a dificuldade de encontrar, no setor privado, uma função com similaridade à de um juiz.

"As funções de juízes, promotores, e advogados são completamente distintas, e a única coisa que há em comum é a formação jurídica. Há carreiras que são típicas de Estado e isso tem que ser preservado. E vale lembrar que a remuneração para várias carreiras já foi mudada, alterando-se para a modalidade de subsídio, que é o pagamento de uma parcela única, que deve ser reajustado anualmente, o que não ocorre", ressalta.

Para o presidente da Associação Espírito-Santense do Ministério Público, Pedro Ivo de Sousa, o governo também poderia priorizar a valorização de suas instituições. "Somos um órgão preocupado com o momento social e econômico, mas não pode haver uma quebra do pacto do estado para com seu servidor", considera.

No mesmo sentido opinou o presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Estadual, Carlos Heugênio Duarte.

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"Não estamos falando de cabides de emprego, estamos falando de quem fez concurso, que faz o estado funcionar", defende.

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