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Efeitos da lei contra abuso de autoridade serão medidos na prática

Efeitos da lei contra abuso de autoridade serão medidos na prática

Especialistas ouvidos pelo Gazeta Online avaliam o projeto aprovado pela Câmara, que criminaliza a prática. O texto poderá ser sancionado ou vetado pelo presidente Jair Bolsonaro

Publicado em 25 de agosto de 2019 às 06:08

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Plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília. (Agência Brasil)

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) tem em suas mãos o poder de aprovar ou de vetar o projeto de lei que criminaliza o abuso de autoridade, aprovado pela Câmara dos Deputados na quarta-feira (14). Mas enquanto ainda não se sabe se o texto vai ou não virar efetivamente uma lei, especialistas defendem que é preciso aguardar para ver como será a aplicação da norma e quais serão seus reais efeitos.

Coordenador do Centro de Justiça e Sociedade da FGV Direito Rio, Michael Mohallem vislumbra diferentes perspectivas. Por um lado, pondera que a força da futura lei poderá tornar as autoridades mais cautelosas quanto à necessidade de provas consistentes para a acusação ou prisão de alguém, o que garantiria um cumprimento mais rígido de direitos no sistema prisional.

No entanto, Mohallem também não descarta a possibilidade de os interesses de classe interferirem nos efeitos da lei. Se sancionada, a lei de abuso de autoridade enquadrará qualquer agente público, seja servidor ou não, da União, Estados e municípios, incluindo, portanto, policiais, guardas municipais, promotores, procuradores e até juízes.

A questão, para Mohallem, é se os juízes, por exemplo, poderão adotar um perfil protetivo diante de seus pares em situações de possível excesso.

“Juízes são uma categoria muito protetiva com sua própria classe. A expectativa é de que eles não devem avançar ou criar uma linha muito dura de interpretação dessa lei em desfavor de juízes e promotores. Temos experiências que mostram que eles são cautelosos. Até porque eles próprios sabem da importância que o juiz não sinta receio de julgar com sua convicção. É ruim ter juízes e promotores temerosos”, argumenta o professor.

Para o professor de Direito Penal e Constitucional da Ufes, Ricardo Gueiros, a lei em questão não traz consigo grandes novidades, visto que muitas das normativas trazidas em seu texto já existem. Contudo, Gueiros não descarta o poder simbólico adquirido pela nova legislação, que foi aprovada em um momento de grande divisão política. Isso, segundo ele, poderá torná-la mais forte.

“As leis em geral são em sua maioria casuísticas. Elas acabam surgindo pelo clamor do momento. A tramitação desse projeto de lei foi iniciada em 2017, ele vinha tramitando devagar e só agora foi aprovado. Eu diria que se trata de uma resposta de parte da sociedade, que é representada pela classe política, em relação ao abuso de autoridade”, diz.

Gueiros acrescenta: “A lei de abuso de autoridade já existe há tempo, mas se outra lei for simbolicamente forte, ela pode ter uma aplicação diferenciada”.

Entre a classe política, o projeto de lei é tratado, de fato, como uma resposta à Operação Lava Jato. A proposta foi apresentada em 2017 pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em 2017 e relatada pelo então senador Roberto Requião, que em muitas ocasiões sempre se manifestou contra supostos abusos da operação Lava Jato. Por outro lado, o projeto já recebeu críticas do ministro da Justiça Sérgio Moro, que na época ainda era juiz.

EFEITO POSITIVO

No entanto, para o professor da Mackenzie e advogado criminalista Edson Luz Knippel, independente do contexto político, a nova lei traz avanços em relação à lei que trata de abuso de autoridade, que data de 1965. Por isso, se aplicada corretamente, pode ter impactos positivos na punição de excessos.

“A lei tem que ser genérica. Ela não tem que prejudicar ou beneficiar operações, mas sim respeitar os direitos individuais das pessoas”, pontua.

Quanto à uma outra hipótese, de que promotores e juízes poderiam se sentir constrangidos em sua atuação, Knippel refuta:

“Se o agente cumprir sua função de forma correta, ele jamais será punido. Esse receio de que seria uma caça às bruxas de desfaz porque divergências sobre a matéria, como, por exemplo, se caberia prisão ou não em um caso, não caracterizam crime. Só resultará em punição se a prisão for completamente fora das possibilidades do ordenamento jurídico”.

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