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Especialistas analisam por que ES só elegeu 17 mulheres no Legislativo

Especialistas analisam por que ES só elegeu 17 mulheres no Legislativo

Resultado de levantamento dos últimos 20 anos mostra que elas ainda têm dificuldade de se eleger. Entre os desafios para mudar isso, está colocar mais mulheres nas cúpulas dos partidos

Publicado em 25 de agosto de 2019 às 13:00

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As mulheres do plenário. Juntas, todas elas somam 35 mandatos - apenas no período entre 1998 e 2000 - na Assembleia, Câmara e Senado. (Divulgação TSE e arquivos pessoais)

Em 20 anos, somente 17 mulheres foram eleitas para os cargos de representação estadual do Espírito Santo, como deputada estadual, deputada federal ou senadora. No mesmo período, 128 homens foram diplomados para esses postos. O resultado foi obtido por um levantamento do G.Dados, , o grupo de jornalismo de dados da Rede Gazeta, para a série "Retrato das Urnas", com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as eleições entre 1998 e 2018. O dado considera a quantidade de pessoas eleitas, e não o número de cargos, já que vários desses homens foram eleitos até 4 ou 5 vezes para essas funções, no período.

O que explica um número tão baixo de mulheres vencendo as eleições, ao longo de tantos anos? E por quê, quando saem vitoriosas, geralmente são sempre as mesmas? O Gazeta Online fez esta análise, contando com a ajuda de duas mulheres que estudam sobre a representação feminina na sociedade:

- Daniela Travaglia de Oliveira Pimentel, analista judiciária do TRE-ES e mestre em Direitos Humanos pela Universidade de Essex

- Maria Angela Rosa Soares, professora da UVV de Ciência Política e socióloga

- Por que os eleitores ainda não votam em mulheres?

Daniela: As cotas foram adotadas na década de 90, assim como em outros países da América Latina, após uma Conferência da ONU, em que se falou muito sobre participação da mulher na política. O que acontece no Brasil? Ele não adotou como uma regra obrigatória desde o início, e a legislação colocou como uma “recomendação”, o que causou uma demora grande na implementação do resultado. Países como Costa Rica, Argentina, Peru e Bolívia adotaram outras medidas complementares, então já estão muito mais avançados do que nós. Entre as medidas que considero necessárias para o Brasil, defendo que haja mais debate nas instituições sobre as consequências que a desigualdade de gênero traz para a sociedade; que haja cotas de gênero também nas instituições, nos governos, para chegar a uma representação mais razoável; e nos partidos, que elas também estejam nos órgãos de direção partidária, para que se tornem líderes também internamente.

Maria Ângela: Há quem defenda que as cotas não sejam só de candidatas, mas também para os cargos. Mas tenho minhas dúvidas se implantar isso, na marra, será positivo. Cotas são ações afirmativas, que tem como conceito políticas públicas de inclusão, onde há desigualdade no acesso aos direitos. Mais mulheres precisam tentar se candidatar com consciência de que têm um papel de transformar o mundo. Enquanto formos colocadas só para cumprir cota, vai ficar no descrédito, vai ser paliativo. Na hora de votar, a questão de gênero também tem que ser levada em conta, a começar pelas próprias mulheres, votando em mulheres. A luta já é desigual demais.

- As mulheres vão precisar estar no comando dos partidos para isso mudar?

Daniela: Com certeza. E não basta ter só representantes nos diretórios, também tem que haver um bloco de influência de mulheres dentro do processo decisório. Elas precisam estar nas cúpulas e na agremiação, como membros, mesmo, para poder competir em pé de igualdade.

Maria Ângela: Nas cúpulas, pode-se perceber que as vozes delas são menos ouvidas. Isso inclusive é um fenômeno que acontece em outras esferas da sociedade, aconteceu até no Supremo Tribunal Federal. A mulher tem que subir o tom de voz para ser ouvida. Se não assimilar o padrão masculino de gestão, não consegue se manter no comando. Mas se elas também não forem mais em número, essa mudança não reverbera, e é preciso mudar isso. Em ambientes muito masculinos, como os partidos, as mulheres muitas vezes são estigmatizadas, tratadas como se "ali não é lugar para elas", "mulher não foi feita para isso".

- As poucas mulheres que se destacam na política do ES têm se perpetuado. Em que medida é benéfico investir mais naquelas que já são mandatárias?

Daniela: Isso passa muito pelos conceitos de patriarcalismo e pelo estereótipo de gêneros que estão enraizados, que vão moldando a forma de ver a mulher na sociedade: as mulheres que estão fora não se veem como capazes de assumir a política, veem dificuldades para conseguir entrar nesse universo, e depois isso reflete no fato de que poucas delas conseguirem vencer as barreiras internas das agremiações.

Maria Ângela: Para poder alterar isso, outras mulheres vão precisar se interessar. Os partidos já tem mais ou menos um perfil sobre o potencial de votos delas, então as novatas ainda saem em desvantagem, os partidos consideram que é mais difícil investir nas desconhecidas. Vejo que a política é um local que, assim como em várias profissões, não basta a mulher ter competência, ela precisa ficar comprovando isso cotidianamente. Elas não têm o mesmo reconhecimento, distinção e respeito nos espaços públicos que os homens, que é a reprodução de um comportamento histórico e cultural. O mundo caminha, mas ainda muito lentamente.

Veja a série "Retratos das urnas" completa

Entenda: o que é o G.Dados?

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É o grupo de jornalismo de dados da Rede Gazeta, que visa qualificar e ampliar a produção de reportagens baseadas em dados. Jornalismo de dados é o processo de descobrimento, coleta, análise, filtragem e combinação de dados para contar histórias.

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