O sigilo é a regra. A publicidade, a exceção. Era para ser o contrário, mas, evocando o Regimento Interno da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, o corregedor Hudson Leal (PRB) tem sido bastante sucinto quando questionado sobre procedimentos que tramitam no órgão. Essa interpretação da norma, no entanto, é questionada por especialistas consultados pelo Gazeta Online.
A falta de informações paira no ar no caso referente ao deputado estadual Capitão Assumção (PSL) que, em discurso na Casa, ofereceu R$ 10 mil a quem matasse um suspeito de assassinato. Conseguiu, assim, a atenção que gostaria e até algum apoio nas redes sociais. Mas também críticas por incitar o cometimento de um crime.
A Corregedoria foi acionada e, desde então, a imprensa tenta saber o que acontece a partir de agora. Questionado na última segunda-feira (16), Hudson Leal mais uma vez esquivou-se. Não deu detalhes sobre o trâmite da investigação nem sobre quando será iniciada.
"De acordo com resolução da Casa, todos os membros da Corregedoria têm que manter discrição e sigilo na sua função. Inclusive eu. É igual no Judiciário, não posso dar opinião pessoal. Ainda tem outras pautas na frente. Tem muito trabalho na Corregedoria", afirmou, na ocasião.
Na última semana, a Procuradoria da própria Assembleia provocou a Corregedoria para que fosse apurado se o caso de Assumção configura ato atentatório contra o decoro parlamentar.
De acordo com o parágrafo primeiro do artigo 14 do Regimento Interno da Assembleia, "os membros da Corregedoria estarão sujeitos, sob pena de imediato desligamento e substituição, a observar a discrição e o sigilo inerentes à natureza de sua função". A resolução 1.775, que institui o Código de Ética e Decoro Parlamentar, contém o mesmo trecho.
"Sou extremamente legalista, sigo o regimento interno e a resolução 1775,que instituiu o código de ética e decoro parlamentar", reforçou Hudson Leal, nesta terça-feira (17).
EQUIVOCADO
Mas isso quer dizer que não podem falar nada? Especialista em Direito Constitucional e professor da FDV, Caleb Salomão diz, de pronto, que não. "O deputado está equivocado. A divulgação de algo relativo a uma fala criminosa de um parlamentar não se enquadra nisso. A sociedade precisa saber das providencias que a Casa está fazendo. É um caso notório (o discurso de Assumção). A Lei de Acesso à Informação, por exemplo, diz que a publicidade é a regra. O sigilo, a exceção", aponta.
Também constitucionalista, Cláudio Colnago avalia que a interpretação de Hudsol Leal quanto ao regimento é um tanto "curiosa". "Quando a gente verifica a regra do sigilo mencionada no regimento, existe uma diferença entre dar informações sobre o conteúdo do processo e informações sobre a tramitação de um processo, ainda que em tese", avalia.
IMPARCIALIDADE
"É recomendável, de fato, que um parlamentar que exerce a função de corregedor não se manifeste sobre o ato, para manter imparcialidade", pondera. "Mas negar informações sobre a tramitação de um processo ético disciplinar como esse já é, a meu ver, uma interpretação errada dessa limitação de sigilo", complementa.
Não é a primeira vez que Hudson Leal interpreta norma de forma bastante ampla. Em relação à própria atuação da Corregedoria no caso de Capitão Assumção, ele alegou que o órgão somente poderia agir se provocado. O regimento, no entanto, diz o contrário:
Questionado pela reportagem sobre entendimento diferente dos especialistas quanto à interpretação do texto, Hudson Leal apenas enviou o texto da resolução que institui o Código de Ética e Decoro Parlamentar, que menciona o sigilo dos integrantes da Corregedoria.
ESPERANDO EUCLÉRIO
Outro integrante do colegiado, o deputado Torino Marques, que é do mesmo partido de Assumção, foi mais transparente. Contou ter sido convidado por Hudson para relatar o caso. Mas ainda não decidiu se vai aceitar a tarefa.
Haveria uma reunião da Corregedoria nesta terça para tratar do assunto, mas o encontro foi adiado porque o vice-presidente, Euclério Sampaio (sem partido), está hospitalizado, sofreu um infarto.
"Tem que saber como vai ser o trâmite. Só vai ter reunião quando Euclério tiver alta", diz Torino. Não poderiam chamar um suplente da Corregedoria? "Nesse caso, não. Então, só quando ele tiver alta".
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