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Nova lei prejudica a gestão pública?

Nova lei prejudica a gestão pública?

Projeto nº 13.655/18, conhecido como "a lei das leis", muda conceitos e dá maior segurança ao gestor, mas há quem suspeite que ela limitaria a possibilidade de responsabilização de agentes que cometem irregularidades

Publicado em 31 de maio de 2018 às 17:51

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OS GOVERNANTES E A LEI

Felipe Itala Rizk é advogado

O sentimento geral da sociedade é de que somente o governante venal ou aquele que comete algum tipo de erro grosseiro em sua gestão é que passa a responder frente às respectivas autoridades pelos seus atos. Entretanto, o senso comum é equivocado.

Um Decreto-Lei do período do Estado Novo da Era Vargas, que disciplina a interpretação e aplicação das leis no Brasil, foi alterado no final do mês de abril deste ano por meio da Lei nº 13.655/18. Por conta disso, houve uma chuva de protestos de alguns membros de órgãos fiscalizadores, em especial daqueles oriundos de tribunais de contas e controladorias, a ponto de solicitarem formalmente que o presidente da República opusesse veto integral ao texto.

Resumidamente, a nova lei impactará diretamente em todas as decisões, sejam elas oriundas do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas ou de controladorias, que pretendam invalidar algum ato ou contrato administrativo.

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A nova lei impactará em todas as decisões, sejam elas oriundas do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas ou de controladorias, que pretendam invalidar algum ato ou contrato administrativo

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Para os críticos dessa lei, ela auxiliará os governantes e demais gestores acusados de improbidade, uma vez que traz novos parâmetros a serem considerados antes e durante as decisões que questionam seus atos, limitando, por consequência, a atuação dos órgãos de controle.

Ocorre que a lei vem para podar os excessos e não para afagar os maus gestores. Detentores de mandatos eletivos, técnicos concursados, secretários de governo, procuradores e tantos outros, não raras vezes têm seus atos colocados em xeque, inclusive com a possibilidade de responderem com seu patrimônio pessoal, caso seja considerado culpados pela instância competente.

Com isso, a inércia ou a negativa a tudo e a todos se tornou o porto seguro para muitos dos integrantes da administração pública, os quais receiam se tornarem réus de algum órgão de controle. É o chamado “apagão decisório” como mencionado pelo ministro do Tribunal de Contas da União Bruno Dantas em recente artigo publicado.

Justamente por conta disso, o artigo 22 da referida lei, a título de exemplo, traz importante avanço: “Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.”

Assim, se no passado houve uma profunda ausência de fiscalização sobre os atos dos governantes e demais pessoas em seu entorno (tese), experimentamos hoje uma hipertrofia do órgãos de controle, judiciais e administrativos, cheia de excessos e, portanto, tão nociva quanto à primeira fase (antítese), daí porque a necessidade de evoluirmos para um equilíbrio (síntese) e, sem dúvida, a Lei 13.655, ainda que de forma acanhada, contribui para tanto.

DISPOSIÇÕES GENÉRICAS

Alfredo Alcure Neto e Gustavo Rubert Rodrigues são professores e auditores de Controle Externo

Recentemente, o mundo jurídico foi surpreendido com uma nova lei que, com a justificativa de trazer maior segurança jurídica aos gestores públicos, trouxe profundas alterações no modo de responsabilização por seus atos. Essa é a Lei nº 13.655/2018, que acrescentou alguns dispositivos à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

O intuito deste artigo é demonstrar quatro pontos que merecem a atenção da sociedade.

O primeiro é que a LINDB funciona como uma lei das leis. Mas o que seria isso? É uma lei que traz disposições mais genéricas, e que serviria para explicar como todas as outras leis devem ser aplicadas. É forçoso reconhecer que as alterações legais foram direcionadas para regular as decisões do Poder Judiciário e Tribunal de Contas sobre os atos dos gestores públicos, distante do objetivo inicial da LINDB.

O segundo ponto guarda relação com a ausência participação da sociedade no debate. A matéria não foi discutida adequadamente. A única audiência realizada, ocorrida no Senado Federal, não teve a participação representantes dos órgãos de controle. Já na Câmara dos Deputados, o projeto que originou a nova lei não foi votado e aprovado no Plenário, mas apenas nas Comissões.

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O erro grosseiro é conceito subjetivo, de não tão fácil constatação. Agora, o agente público que agir de forma culposa não será mais responsabilizado? A resposta com o tempo

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O terceiro ponto diz respeito à responsabilização dos agentes públicos. Conforme artigo 5º da Lei de Improbidade Administrativa, norma que é referência no combate à corrupção, se o agente público causa lesão ao erário, tendo atuado com “dolo ou culpa”, responderá pelo dano e será punido. Já a nova lei nem menciona a palavra culpa, preferindo utilizar o conceito de “erro grosseiro”.

A omissão da lei, ao deixar de trazer um conceito de amplo conhecimento pelos operadores do direito (culpa), e incluir conceito jurídico não usual nessa seara (erro grosseiro), acaba criando o que se propôs a combater, que é a insegurança jurídica.

O dolo, muitas vezes, é de difícil comprovação, por envolver a intenção do agente. Já o erro grosseiro é conceito subjetivo, de não tão fácil constatação. A partir de agora, o agente público que agir de forma culposa, não será mais responsabilizado? A resposta virá com o tempo.

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O último ponto que merece destaque neste breve texto refere-se a um exercício de futurologia e inversão de valores impostos ao Poder Judiciário e Tribunal de Contas. A nova norma exige que a decisão dos órgãos julgadores leve em consideração possíveis alternativas para as medidas que anulem o ato ou contrato administrativo. Ou seja, ao verificar uma ilegalidade, deverá a decisão oferecer opções ao gestor não previstas no processo. De julgador, acaba virando coparticipante da gestão, o que subverte o seu papel constitucional.

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