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Terapias on-line são opção segura?

Terapias on-line são opção segura?

Nova resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) regulamenta atendimento psicológico pela internet, mas essa forma de consulta serve para todos os casos ou todos os tipos de tratamento?

Publicado em 18 de maio de 2018 às 22:20

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Consulta pelo WhatsApp

INTERNET USADA DE MANEIRA COMPLEMENTAR

Maria Carolina Fonseca Barbosa Roseiro é presidenta da Comissão de Orientação e Fiscalização (COF) do Conselho Regional de Psicologia do Espírito Santo (CRP-ES)

No último dia 11 de maio, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) publicou a Resolução 11/2018, que regulamenta a atuação dos psicólogos por meio de tecnologias da informação e da comunicação. Entre os serviços previstos estão consultas e/ou atendimentos psicológicos para avaliação, orientação e/ou intervenção em processos individuais e grupais e processos de seleção de pessoal, assim como supervisão técnica. Além disso, o documento prevê a utilização de instrumentos psicológicos regulamentados, com normatização e padronização específica.

É preciso destacar que o Conselho Regional de Psicologia do Espírito Santo (CRP-ES) recomenda que os atendimentos em psicoterapia sejam realizados presencialmente e que as plataformas de comunicação online sejam utilizadas de maneira complementar. Vale ressaltar que essas ferramentas já fazem parte do dia a dia de muitos profissionais e a Resolução busca estabelecer regras para esse uso. Por isso, o CRP-ES e os demais conselhos regionais em todo o Brasil iniciarão debates com o objetivo de estabelecer quais tecnologias são as mais adequadas e poderão ser utilizadas para esse fim.

Aspas de citação

Está proibido o atendimento on-line em situações de violação de direitos humanos ou de violência, casos de transtorno psíquico grave e risco de suicídio

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Além disso, os conselhos regionais definirão os critérios para o cadastramento dos profissionais que desejam prestar serviços psicológicos por meio da internet. Por isso será importante que a população capixaba entre em contato com o CRP-ES para verificar se o psicólogo possui essa autorização.

Contudo, a Resolução do CFP, que entrará em vigor 180 dias após a data da sua publicação, já apresenta algumas determinações prévias. O psicólogo deverá especificar ao seu paciente os recursos tecnológicos que serão utilizados no serviço que será prestado, sendo imprescindível o sigilo das informações.

Está proibido o atendimento on-line em situações de violação de direitos humanos ou de violência, casos de transtorno psíquico grave e risco de suicídio. Nestas situações, o psicólogo deverá encaminhar o paciente para o atendimento presencial. Quanto ao atendimento a crianças e adolescentes, é indispensável que haja autorização expressa de ao menos um dos responsáveis legais. Em relação às pessoas com deficiência, o profissional deverá respeitar as especificidades e a adequação dos métodos e instrumentos, de acordo com legislação vigente.

Como em qualquer outro tipo de atuação profissional em Psicologia, os serviços prestados devem ser realizados com qualidade e em condições de trabalho dignas com a utilização de técnicas embasadas na ciência psicológica. Os atendimentos sempre devem observar os princípios do Código de Ética Profissional do Psicólogo.

EXISTEM "CONDIÇÕES" PARA CHEGAR AO OBJETIVO

Alcione Vasconcellos é psicanalista, analista Membro da Escola Lacaniana de Psicanálise de Vitória

Diante da regularização por parte do Conselho Federal de Psicologia (CFP) das ditas “terapias on-line” e da crescente oferta desse tipo de serviço, também nós, psicanalistas, precisamos nos questionar se tal instrumento poderia ser utilizado pela psicanálise.

A única “regra” na psicanálise é a “associação livre”. E ela está do lado do analisando: falar o que vier à cabeça, sem censurar nada, mesmo que seja algo desagradável. Podemos argumentar que a regra fundamental da psicanálise pode muito bem ser cumprida em um tratamento on-line!

No entanto, existem “condições” para que uma análise chegue a seu objetivo que é a passagem do sujeito da posição de analisando para a posição de analista de seu próprio sintoma. Essas condições não devem ser elevadas artificialmente ao estatuto de regras, mas têm suas bases inscritas na economia psíquica.

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Outra condição é o trabalho com o tempo. A frequência das sessões, o tempo de cada sessão e o tempo do próprio tratamento é variável para cada sujeito

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Nas sessões presenciais tudo o que se passa no setting analítico é importante: se o analisando se atrasa ou se adianta, a atitude corporal com que entra na sala, seu gestual enquanto fala... Esse tempo é fundamental para estabelecer a confiança e a ligação do inconsciente do analisante com seu analista. Fico me perguntando se diante de uma pequena tela seria possível captar essa riqueza de detalhes. Como operar o desvio de olhar oferecido pelo uso do divã numa videochamada?

Outra condição é o trabalho com o tempo. A frequência das sessões, o tempo de cada sessão e o tempo do próprio tratamento é variável para cada sujeito e determinado pela própria fala do analisando, uma vez que o inconsciente é estruturado como uma linguagem. Nesse sentido, me assusta ver nos anúncios de terapias on-line a promessa de que o analisando poderá falar com seu terapeuta a hora que quiser, sem necessidade de marcar previamente horário! Já imagino o analista fazendo compras no supermercado, atendendo seu paciente ao telefone ou numa videochamada enquanto pega uma lata de atum! E sendo consumido como gotas de Rivotril às quais se lança mão, como é comum se fazer hoje em dia, infelizmente, em todo momento de ansiedade... Sem mencionar a possibilidade de a sessão ser gravada, divulgada, interrompida por falhas de conexão...

O dinheiro entra como elemento importante no manejo analítico. Mas, passaria, no atendimento on-line, a ser assepticamente depositado à distância, não passando da mão do analisante à do analista. Perda virtual de gozo?

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Outra questão é como atender crianças ou sujeitos com estrutura psicótica, utilizando as tecnologias de videochamada? Sabemos o quanto o psicanalista precisa emprestar o próprio corpo nesses atendimentos. Ainda assim, alguns psicanalistas já atendem se utilizando das novas tecnologias. Precisam partilhar seus resultados com os pares nas instituições e publicações psicanalíticas, para que possamos ampliar a reflexão sobre o assunto. Resta saber se ao final, poderemos ainda chamar o que se fará on-line de psicanálise!

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