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O Mercosul deve ser prioridade?

O Mercosul deve ser prioridade?

Ministro da Economia do governo Jair Bolsonaro (PSL), Paulo Guedes declarou a intenção de ampliar acordos comerciais com países fora do bloco (Uruguai, Argentina, Paraguai e Brasil) o que gerou reações de economistas e diplomatas

Publicado em 11 de novembro de 2018 às 13:21

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(Ilustração/A Gazeta)

Bloco é instrumento de inserção competitiva

José Vicente de Sá Pimentel é embaixador

Há várias razões para manter a prioridade do Mercosul. O Brasil é a espinha dorsal do bloco, junto com a Argentina, vizinha com que a história e a geografia nos brindaram. Com ela cumpre desestimular rivalidades improdutivas e desenvolver um mercado complementar para nossas empresas, seguindo o princípio fundamental de que a paz e o desenvolvimento econômico são complementares.

Ao elaborar nossas posições no Mercosul, os diplomatas ouviram sempre os representantes da indústria e do comércio brasileiros. As regras do jogo previam a redução progressiva das barreiras tarifárias e não tarifárias, até sua total eliminação. Uma Tarifa Externa Comum (TEC), que deveria ser progressivamente eliminada, permitiu porém perfurações para acomodar situações específicas.

Os resultados iniciais foram excelentes. Se a sequência não foi tão positiva, a responsabilidade em parte foi nossa. A redução da lista de exceções não se verificou, em boa parte, devido à estrutura tarifária restritiva que se tinha no Brasil, e que conseguimos introduzir na TEC. O descompasso entre nossa política macroeconômica e a da Argentina gerava um problema atrás do outro.

Nos anos 2000, foram as sucessivas medidas protecionistas argentinas que agravaram o quadro, para indignação de setores empresariais brasileiros. O Mercosul se fechou e perdeu parceiros mais antenados com as tendências globais. Quando o governo Dilma se engajou na questão da Venezuela, a ideologia parecia triunfar sobre o bom senso, decretando que o bloco tinha chegado ao seu limite de validade.

Bastaram, porém, dois anos de gestão diplomática realista para as coisas mudarem. Desde 2017, o Mercosul se oxigena e abre negociações com a Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, México e Peru) e com a União Europeia. No ano passado, o volume de comércio intrabloco atingiu US$ 34 bilhões, um aumento de 17% em relação ao período anterior. No primeiro trimestre de 2018, nosso fluxo com o bloco aumentou quase 14%: exportamos cerca de US$ 6 bilhões e importamos a metade disso. Os progressos se fizeram sentir sobretudo nos setores de calçados, açúcar e veículos automotores. Esses e outros exportadores não vão apoiar mudanças políticas agora.

É natural que cada governo tenha suas prioridades e será justo se passarmos a priorizar as relações com os Estados Unidos. Um país das dimensões do Brasil não pode, contudo, deixar-se obcecar por uma prioridade exclusiva. Nem seria prudente exagerarmos nos agrados aos americanos. Basta ver que Kim Jong-Un manteve seus foguetes nucleares e ganhou o afeto de Trump.

O Mercosul é um instrumento de inserção competitiva dos quatro países membros no mercado internacional. Como tal, permanece sendo um dos principais objetivos diplomáticos brasileiros. Qualquer gestor pragmático saberá reconhecer sua prioridade.

 

Abertura comercial traz uma série de benefícios

 

Fernando Galdi é doutor em Ciências Contábeis pela USP, professor da Fucape e comentarista da CBN Vitória

O futuro governo de Jair Bolsonaro (PSL) aponta para uma guinada em relação à abertura comercial do Brasil e uma mudança de foco nos acordos comerciais, prometendo dar mais atenção a acordos bilaterais com países desenvolvidos do que ao Mercosul. Isso deve ser visto como positivo pela maioria da população, pois trará benefícios diretos para os consumidores. É importante que tenhamos claro que somos uma economia fechada do ponto de vista comercial. Não porque barramos produtos, mas sim porque, em determinados setores, o imposto de importação e demais taxas incidentes sobre produtos importados tornam o consumo impraticável.

A burocracia e o custo atrelado a ela também somam na barreira comercial existente no Brasil. Exemplos de impactos contraproducentes não faltam. Temos o iPhone mais caro do mundo. Carros importados são muito mais caros aqui do que seriam os equivalentes em outros países. Praticamente qualquer máquina ou eletroeletrônico com componentes importados aqui custa o dobro do que lá fora, e por aí vai.

Um estudo recente da FGV aponta que a abertura comercial geraria um impacto positivo no PIB brasileiro de 0,5% até 2030. Nesse contexto, acordos bilaterais com economias desenvolvidas para uma maior abertura comercial seriam muito positivos para a sociedade brasileira, pois possibilitariam ganhos ainda maiores, possibilitando que os brasileiros usufruam daquilo que há de melhor no mundo.

Contudo, há setores que são contrários, dizendo que uma abertura comercial tiraria competitividade da indústria brasileira, pois esta não estaria apta a concorrer com os importados. Isso pode até ser verdade para um conjunto restrito de setores, mas as análises e evidências demonstram que o benefício da abertura comercial seria maior para um número maior de pessoas do que seriam os seus custos para um número reduzido de indivíduos (muitos deles empresários de setores protegidos pelas barreiras impostas pelo governo).

Com a abertura, setores ineficientes na economia brasileira teriam que se reinventar para ficar competitivos. Assim passariam a existir empresas sustentáveis e que gerem bem-estar para a população e não empresas que se seguram na proteção do governo às custas da população. Temos que investir e incentivar aquilo que temos vantagem competitiva.

O agronegócio é um excelente exemplo. A tecnologia aliada com as vantagens competitivas do solo brasileiro nos colocam em posição de destaque neste importantíssimo setor no mundo, com produtos cada vez mais sofisticados. Essa sinergia também pode e deve existir em diversos outros setores da economia.

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As barreiras comerciais dificultam esse ciclo virtuoso, pois muitas vezes desviam recursos e esforços para setores que não somos competitivos. Assim a prioridade nos acordos comerciais a serem realizados pelo futuro governo devem levar em conta estas potenciais sinergias e não aspectos ideológicos.

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