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Salário do STF deve ser teto do funcionalismo?

Salário do STF deve ser teto do funcionalismo?

Remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) serve de teto para salários de servidores e, por isso, gera efeito cascata nos pagamentos quando há reajuste, como o de 16,38% de novembro

Publicado em 17 de dezembro de 2018 às 12:54

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DESCONTROLE DAS CONTAS

Karison Pimentel

Advogado especializado em Direito e Processo Tributário

A Constituição Federal, em seu Artigo 37, garante um limite máximo de recebimento para pessoas que ocupam cargos, funções ou empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional. E essa definição máxima é o limite do salário do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Esse mesmo artigo coloca como o patamar máximo a ser recebido pelos servidores de outros entes da Federação o valor do recebimento em espécie do ministro do STF. Tal valor, no entanto, é apenas uma previsão, uma possibilidade máxima. Quem determina a gradação, até o teto, são os próprios entes – Estado, município ou Distrito Federal – em suas legislações.

Embora a Constituição possibilite que os salários dos servidores tenham como teto o valor do salário do ministro do STF, tal possibilidade, atualmente, tornou-se uma obrigação. Quando o ministro do Supremo, que está na esfera federal, tem uma elevação no valor do seu vencimento mensal, ocorre de maneira praticamente compulsória um reajuste nos demais salários do funcionalismo. Isso porque os próprios entes federativos estaduais e municipais vinculam um aumento automático do benefício dos próprios servidores ao ocorrido no Supremo.

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Embora a Constituição possibilite que os salários dos servidores tenham como teto o salário de ministros do STF, tal possibilidade virou uma obrigação

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Essa vinculação automática se mostra perniciosa, pois não reflete a realidade econômica daquele ente federativo. Os Estados federados possuem realidades financeiras completamente distintas, sendo que a maioria, inclusive, apresenta déficit em seu orçamento, e o aumento do valor do vencimento do Supremo acaba por, obrigatoriamente, resultar em despesas nos âmbitos estaduais e municipais, gerando um descontrole nas contas públicas.

A instituição de um mecanismo, criado por lei, para conferir certo grau de aumento condizente com a realidade econômica de cada Estado, com base na própria Lei de Responsabilidade Fiscal, poderia solucionar esse conflito de interesses. Pois, embora o aumento salarial dos ministros do STF ocorra na esfera federal, ele tem mais impacto sobre os Estados, que terão todos os seus cargos da magistratura, entre outras carreiras do serviço público vinculadas, com seus salários aumentados em função de uma decisão do Supremo, aprovada pelo Legislativo e sancionada pelo Executivo com base no princípio da separação dos Poderes.

O teto do salário do funcionalismo público ser o valor do Supremo é constitucional e indiscutível. Logo, não existe uma crítica à possibilidade do Poder Judiciário em elevar o salário, em corrigir os efeitos da inflação, pois, assim como Legislativo e Executivo, são Poderes independentes.

A crítica é devido à vinculação automática do aumento dos vencimentos nas outras esferas, pois isso não condiz com o orçamento dos outros entes. O que devia ser implantado, quando existe a necessidade de vinculação salarial com os valores do Supremo, é a realização de uma gradação do aumento em função da realidade das contas públicas de cada Estado.

A ideia do mecanismo garantiria ao ente federativo a possibilidade de ter o seu Poder Judiciário atuando com o Legislativo e o Executivo para ter um controle das contas públicas, uma manutenção de contas equilibradas, para então analisar uma possibilidade de aumento nos próprios vencimentos com base no acréscimo salarial do STF, entretanto, graduado pelas condições das contas de cada Estado.

TRANSPARÊNCIA GARANTIDA

Flávio Lucas e Eduardo André

Vice-presidente da 2ª Região e 1º secretário da Associação dos Juízes Federais do Brasil

Os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal atualmente, em cumprimento ao Artigo 37, XI da Constituição Federal, são o limite máximo de remuneração dos servidores públicos no país, valendo tal regra para todas as esferas (estadual, municipal e federal). Interessante notar que, apesar de os Três Poderes (Judiciário, Executivo e Legislativo) serem independentes na forma do Artigo 2º da Constituição Federal, a regra do teto constitucional só faz referência ao Judiciário.

Obviamente que este dispositivo traz segurança jurídica e também transparência para a sociedade, já que, em qualquer município do nosso país continental e repleto de realidades distintas, o cidadão tem a ciência de quanto suas autoridades podem receber dos cofres públicos.

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Este dispositivo traz segurança jurídica e transparência, pois dá ao cidadão a ciência de quanto suas autoridades podem receber dos cofres públicos

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Entretanto, uma regra que também está na Constituição Federal, especificamente no Artigo 37, X, e que vem sendo constantemente descumprida, acabou deturpando completamente a visão que a sociedade tem dos servidores públicos. Falo da previsão de revisão geral anual sem distinção de índices entre os servidores públicos civis e os membros de Poder e detentores de cargos eletivos. Este índice de revisão anual logicamente não podia vir previsto no Texto Constitucional, que não pode ser tão específico, porém, gera a legítima expectativa nos servidores públicos de que ao menos a inflação seja recomposta. Apenas comparando por alto, para facilitar a compreensão do leitor, esta equivaleria aos dissídios anuais que todas as categorias da iniciativa privada possuem. Não é necessário dizer que em alguns momentos de crise econômica grave poderiam os servidores conviver com uma revisão menor que a inflação ou, excepcionalmente, até um ano sem revisão.

Infelizmente, não é a realidade do Brasil atual. Tornou-se normal para os servidores públicos passarem de três a quatro anos sem nenhuma alteração na sua remuneração e quando esta é deferida após este prazo é considerada abusiva. O trabalhador da iniciativa privada que se mantém no mesmo emprego desde janeiro de 2015 lembra da sua remuneração naquele mês? Os juízes federais, por exemplo, lembram, afinal, continuam ganhando o mesmo valor nominal, com perda de potencial aquisitivo estimada em aproximadamente 40%.

A sociedade está correta em cobrar a transparência nos vencimentos dos servidores públicos e dos juízes. Nem os mais severos críticos questionam a necessidade de uma remuneração adequado aos magistrados em geral, compatível com a responsabilidade de suas atribuições e com as restrições impostas pela legislação aos que ocupam os cargos. Contudo, sempre que a sociedade discute a atualização monetária dos subsídios dos ministros do STF instaura-se uma celeuma. Tanto assim que a última revisão aprovada, que entrará em vigor em 1/1/2019, foi atacada em todos os setores da mídia e da sociedade como algo abusivo, fora de propósito, até desrespeitoso com os milhões de desempregados do país, já que foi concedida no percentual de 16,38%. Ora, toda crítica e opinião é válida, todavia seria justo falar que a última revisão ocorreu em janeiro de 2015.

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Outro ponto que não pode ser desprezado é que o teto constitucional vale para todo o país, e que o custo de vida de nossos Estados e municípios é muito diferente dependendo do local onde a pessoa viva e trabalhe. Dessa forma, como não há maneiras de permitir remunerações distintas para os mesmos cargos nas esferas federal e estadual, principalmente, a revisão anual, mas que um direito do servidor, é uma necessidade da Administração Pública para manter bons níveis de prestação de serviços. A ideia de que o limite máximo de remuneração seja o dos ministros do STF, com revisão anual, não deve ser atacada, pela transparência garantida.

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