Encontro diplomático com saldo inédito
Helvécio de Jesus Júnior é doutor em História e professor da UVV
Por mais de uma década, a política externa brasileira foi partidarizada por uma nociva influência socialista que produziu resultados frustrantes para o Brasil, entre os quais podemos citar a aproximação e o apoio financeiro e político de ditaduras como a Cuba dos irmãos Castro, a Venezuela de Chávez e Maduro e o Irã de Ahmadinejad.
A tradição da diplomacia do Barão de Rio Branco foi quebrada e o lulopetismo vilipendiou tradicionais parceiros e aliados do Brasil como os EUA, que foram os primeiros a reconhecer a independência do Brasil e, na maior parte de nossa história, foram também nossos maiores parceiros comerciais.
Com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, houve a mudança tão esperada em nossa diplomacia. O Brasil voltou a valorizar sua relação com a maior potência econômica do mundo, deixando de lado esse antiamericanismo histriônico e juvenil da era lulopetista.
Na diplomacia agora liderada por Ernesto Araújo, percebe-se a intenção de resgatar a proeminência do Brasil nos assuntos externos como um global player, ao mesmo tempo em que se recuperam as relações bilaterais importantes como a aproximação com os norte-americanos. É óbvio que o alinhamento de ideias entre Donald Trump e Bolsonaro ajudou bastante e, por essa razão, a atual visita aos Estados Unidos pode ser vista como um sucesso. Basta verificar os acordos firmados.
Em menos de três dias, Bolsonaro conseguiu o maior pacote de concessões que um governo americano alguma vez cedeu ao Brasil em pouco mais de 30 anos de democracia. Acordos de comércio e redução tarifária para ambos; acordo de salvaguardas tecnológicas para o uso da base de lançamento de foguetes de Alcântara, o que na prática trará recursos para o programa espacial brasileiro; e os acordos entre a Polícia Federal brasileira e as agências de segurança dos EUA para compartilhar informações de combate aos crimes transnacionais e terrorismo.
Além disso, Donald Trump declarou o Brasil como aliado não-membro da Otan, a maior aliança militar do mundo. E, por fim, talvez mais importante, a promessa norte-americana de apoiar a entrada do Brasil na OCDE, a organização internacional que congrega os países mais desenvolvidos do mundo. Ao entrar na OCDE, o Brasil ganhará um selo importantíssimo para investidores internacionais.
O Brasil, por seu turno, pretende facilitar o ingresso de turistas dos EUA, Japão, Canadá e Austrália, algo muito importante também, pois colocará o país entre as principais rotas de turismo mundial atraindo recursos e gerando empregos. Ou seja, só com essa ação haverá uma alavancagem do setor de turismo que nenhum outro governo jamais conseguiu nos governos anteriores. Em suma, é inegável que o resultado dessa amizade Bolsonaro-Trump é muito positivo até o momento.
Assumimos o nosso complexo de vira-latas
Ueber José de Oliveira é doutor em Ciência Política e professor da Ufes
Apesar da alternância de poder, o Itamaraty construiu determinadas linhas de atuação na política externa brasileira que se converteram em política de Estado reconhecida e respeitada. Elas estão consagradas no Art. 4º da Constituição e têm como princípios a autodeterminação dos povos, a prevalência dos direitos humanos, a igualdade entre os Estados, a defesa da paz, a solução pacífica dos conflitos, o repúdio ao terrorismo e ao racismo, e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, além do pragmatismo e da reciprocidade.
Diante disso, a visita do presidente Bolsonaro aos EUA foi desastrosa em diversos aspectos, marcada por muitas concessões e pouquíssimos dividendos: 1) a desobrigação de visto para norte-americanos sem a contrapartida, o que fere o princípio da reciprocidade; 2) A cessão da Base de Alcântara, no Maranhão, para operações aéreo-espaciais dos EUA, iniciativa que ainda depende da aprovação do Congresso, mas que fere frontalmente a soberania; 3) A abdicação de tratamento diferenciado na OMC em troca de apoio, sem nenhuma garantia, para a entrada do Brasil na OCDE. Abrir mão da condição de país emergente leva a perdas de várias vantagens no comércio internacional e, caso isso se efetive, a economia brasileira tende a sofrer, em especial a agricultura; 4) A visita misteriosa, fora da agenda oficial, à Central Intelligence Agency (CIA), cuja função, entre outras, sempre foi promover intervenções em outros países. Na oportunidade, o presidente e o ministro Sérgio Moro se encontraram com Gina Haspel, diretora do órgão e que foi, num passado não muito distante, responsável por prisões secretas e tortura contra prisioneiros. Por que a visita estava fora da agenda? Do que foram tratar naquela agência de espionagem?; 5) A compra de 750 mil toneladas de trigo americano sem cobrar tarifa, o que prejudica grandemente o agronegócio.
Além disso, a visita foi recheada de diversas gafes e declarações desastrosas. Em uma delas, o presidente afirmou que a maioria dos imigrantes brasileiros ilegais não tem boas intenções no EUA. Em um jantar com lideranças conservadoras sem nenhuma importância junto à Casa Branca, entre elas o astrólogo Olavo de Carvalho e Steve Bannon, o ex-guru de Trump, Bolsonaro afirmou que o sentido de seu governo não é construir coisas para o povo brasileiro, mas desconstruir. Afirmou ainda que o Brasil caminhava para o comunismo e que sua eleição teria representado o milagre salvacionista da nação. Fez declarações dúbias sobre a Venezuela, ao citar a capacidade bélica dos EUA para resolver a questão. Na visita à Casa Branca, não levou o chanceler Ernesto Araújo, mas sim o seu filho 03, gerando mal-estar na comitiva.
Enfim, nota-se que certo núcleo do governo ainda permanece em campanha, completamente descolado da realidade e tal como o Exército de Brancaleone, inventa inimigos: o comunismo difuso, a ideologia de gênero, a Venezuela. Com isso, leva o país a acordos espúrios, exposições vexatórias e a uma vassalagem desmedida. No fim, o Brasil e o Itamaraty se apequenam e, como diria Nelson Rodrigues, nós, brasileiros, assumimos o nosso complexo de vira-latas!
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