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Coliving: conheça uma nova forma de morar

Coliving: conheça uma nova forma de morar

Movimento, comum na Europa e nos Estados Unidos, ganha adeptos no Brasil e no ES, principalmente entre os jovens. Entenda mais

Publicado em 23 de julho de 2018 às 12:06

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Ernesto Rabello mora com as amigas, Aressa Alves (de óculos) e Danielen Brandão: coliving é tendência. (Fernando Madeira)

Muita gente sonha em morar sozinha, ser dona do próprio espaço e da própria bagunça. Mas há quem queira fugir da solidão e, na contramão de muitos jovens que alcançam a independência, prefira dividir a casa com estranhos.

São pessoas que fazem parte de um movimento chamado “coliving”, um novo conceito de vida que é bem comum na Europa e nos Estados Unidos e que nos últimos anos vem atraindo adeptos no Brasil. E no Espírito Santo não é diferente.

Faz lembrar muito as famosas repúblicas, que juntam estudantes com o objetivo principal de economizar com aluguel. Mas no coliving, a grana não é a questão central. Claro que as contas são todas divididas entre os moradores, mas o traço comum entre elas vai além do lado financeiro.

“Não se trata só de dividir o mesmo quarto, a mesma casa. É querer morar numa comunidade, estar a fim de se relacionar e de aprofundar essa relação. Não é morar com qualquer um, mas sim com alguém que te importa muito. É uma sensação de família mesmo”, diz Ana Laura Macedo, que vem fazendo palestras pelo país contando a experiência do Casoca, uma comunidade urbana que funcionou no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, de 2015 a 2017 e chegou a abrigar 17 pessoas.

O psicólogo, psicoterapeuta corporal e professor de ioga Ernesto Grillo Rabello morou sozinho por muito tempo. Mas o lugar que ele chama de lar hoje tem a presença de duas amigas, a Aressa Alves e a Danielen Brandão. Dois gatos, o Calvin e o Café, completam a família, que está junta há um ano e meio, num apartamento em Jardim Camburi, em Vitória.

Convivência

“O legal mesmo é compartilhar um modo de vida. São duas grandes amigas, e a gente pode se ver todos os dias, se apoiar. Nossa convivência é maravilhosa”, conta Ernesto.

Aressa e Danielen se conhecem há mais tempo, há 15 anos pelo menos, vieram da mesma cidade, Uberaba (MG) e moram na mesma casa há quatro anos. Antes de o Ernesto chegar para fechar o triângulo, outras pessoas passaram pelo lugar.

“A amizade pode ser o disparador desse estar coletivo. Mas é preciso ter uma filosofia de vida parecida. Quando o Ernesto veio, a dinâmica mudou. É um triângulo que deu certo! Nós três temos muita coisa em comum. Somos da mesma faixa etária e gostamos de gatos e plantas”, comenta Danielen, que é estudante de Psicologia e atriz.

O trio vive em total harmonia, um aspecto que é fundamental para quem resolve se mudar para uma casa coletiva. “Antes do Ernesto, moramos com uma pessoa que não se adaptou bem, abusou da hospitalidade e foi ‘convidada’ a ir embora. Agora está funcionando bem. Combinamos tudo, quem vai ficar com a limpeza e quem vai alimentar os gatos durante uma semana, por exemplo. Não temos pretensão de que as coisas vão ser sempre maravilhosas, mas temos muito diálogo, comprometimento com a casa, com a convivência”, cita Danielen.

A relação entre os moradores nem sempre é fácil, lembra Ana Laura. “Às vezes, há conflitos. Mas todos têm que estar abertos para dialogar. Morar assim é uma escola de relação, onde o desafio é se relacionar de verdade e não se fechar.”

Dessa troca, sai muita coisa boa, garante ela. “É um ambiente de muita criação, muita ideia, muitos sonhos. Isso gera autoconhecimento, maturidade.”

 

"Moradores viram uma família"

William e Nataly moram na mesma casa, um sobrado de quatro quartos, área verde, perto do mar, em Jacaraípe, na Serra. Eles não são um casal. Tampouco são parentes... Mas é como se fossem.

A casa funciona no modelo coliving, ou seja, está sempre aberta a novos hóspedes, que ganham a acomodação em troca de algum serviço ou alugam um quarto. O restante da casa é compartilhado entre todos.

“Passei uma temporada em Bali, na Indonésia, onde esse conceito é muito comum. Há muitos nômades digitais que vivem em comunidades. Me identifiquei muito e, como tinha um espaço físico aqui, decidi dar início a esse projeto”, diz Nataly Pereira Caldas, 32 anos, fundadora do Espaço Ananda.

A ideia, diz ela, é que os membros da casa passem pelo menos um mês ali. “Tem esse ambiente de comunidade e colaboraçao. Meu desejo é atender a diferentes tipos de demandas de viajantes, pessoas com esse perfil, que tenham ideais para compartilhar, algo para trocar. Já recebi voluntários que me ajudaram com criação de conteúdo e marketing do espaço, por exemplo. É um lugar em que economizam, mas ganham uma família”, comenta a jovem, que é instrutora de ioga.

William Souza, 29 anos, vive uma fase de transição e resolveu encarar a proposta. No espaço que divide com Nataly, ele paga pela moradia ajudando com a organização interna.

Receber pessoas estranhas em casa pode ser arriscado. Por isso, no coliving, é preciso se cercar de certos cuidados.

“Não fecho as portas a ninguém. Mas faço uma ficha, pego documentos. Tem que ter critérios para receber. A entrada da casa, por exemplo, exige uma senha. Se foi gente embora, a gente muda a senha”, diz Nataly.

Ana Laura Macedo, que sempre viveu dentro do formato coliving, explica que os critérios para novos moradores e as próprias regras de convivência interna variam muito de uma casa para outra.

“Tudo se transforma muito. Desde o espaço físico. Há grupos que vão mudando de casa... O próprio grupo vai mudando, pedindo novos acordos, novas regras. Mas é uma vivência muito intensa. E sempre continua um propósito inicial que faz essa gente ficar junta, um desejo de aprofundar as relações. A sensação é de ser uma família mesmo”, comenta ela.

Plano de criar um espaço único para mães solteiras

Mães solteiras com filhos pequenos morando juntas, no mesmo espaço. Será que dá certo? “Não tenho dúvida de que dá certo e é necessário. Sou mãe. Mulher isolada é equação que não fecha conta”, diz a gestora de projetos e doula Gabriela Valente, 35 anos, que planeja criar um coliving materno.

Ela ensaiou um modelo no Rio, onde morava, mas não deu certo. “Éramos três amigas, cada uma com uma filha. Queríamos uma casa, mas os preços no Rio estão muito altos. Sem falar na questão da segurança. Não ficou viável”, contou a mãe da Clara, de 5 anos.

De volta a Fortaleza, Gabriela pensa em encontrar mulheres dispostas a encarar esse novo modelo de moradia que ela acredita ser o melhor para mães que precisam criar os filhos sozinhas, sem a presença do parceiro.

“São muitas mulheres criando seus filhos sozinhas dentro de apartamentos. Elas ficam sobrecarregadas, isoladas, sem rede de apoio e sem vida social. Fica insustentável. A gente inventou uma sociedade muito mais individualista do que precisava. Se quisermos sair desse buraco, é preciso desenhar novas soluções, novos formatos de convivência. E não é só para resolver nossa vida, particularmente falando. Esse novo modelo seria uma solução social, que ajudaria na saúde pública, na mobilidade”, aponta Gabriela.

O coliving de mães solo, como ela chama, poderia funcionar numa mesma casa ou numa vila ou condomínio. “Essas mães fariam um revezamento. Um dia, uma dá o jantar às crianças. Outra, as leva à escola. Hoje em dia, muitas crianças são filhas únicas. E elas precisam de mais do que só pai e mãe. Nessa proposta, elas podem crescer com outras crianças, como se fossem irmãos. Podem compartilhar roupas, se forem da mesma faixa etária. Criança precisa de casa cheia, de bicho”, afirma Gabriela.

 

Saiba mais

O conceito

O coliving é um movimento que é bastante forte na Europa e nos Estados Unidos, de pessoas que resolveram adotar esse conceito de vida de casa compartilhada. A divisão das contas da moradia acontece, mas não é a questão principal

Não é república

O coliving lembra as repúblicas, comuns entre estudantes. Mas enquanto numa república o objetivo principal é dividir os custos de uma moradia, no coliving a proposta é compartilhar uma experiência de vida com pessoas com as mesmas motivações pessoais ou profissionais

Regras (ou não)

No coliving, os moradores são livres para definir as regras da casa. Pode ser tudo organizado, cada qual com seu armário pessoal, com tarefas bem divididas... Mas há modelos com dinâmicas próprias, mais soltas. Como em toda família que vive junto, às vezes a convivência gera conflitos. Mas normalmente, os moradores tentam se entender com diálogo

Outros movimentos parecidos

Cohousing ou co-lares

A ideia é pessoas morando em casas separadas, mas com espaços de uso comum. Pode ser em vilas ou condomínios, e o objetivo é o mesmo do coliving, como uma alternativa aos asilos

Coworking

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Movimento de pessoas que se unem num mesmo espaço de trabalho, que vai permitir a troca de ideias, de contatos e divisão de custos

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