> >
Confusão no MEC, prejuízos no ensino: veja análises de especialistas do ES

Confusão no MEC, prejuízos no ensino: veja análises de especialistas do ES

Em meio à crise instaurada no Ministério da Educação, especialistas ouvidas pelo Gazeta Online apontam paralisação de programas e atrasos em repasses de recursos

Publicado em 27 de março de 2019 às 23:14

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, na Câmara dos Deputados. (Cleia Viana/Câmara dos Deputados)

Não se passam 24 horas sem que uma nova polêmica protagonizada por membros da cúpula do Ministério da Educação (MEC) aconteça. Nesta quarta-feira (27), o ex-secretário do Instituto Nacional de Pesquisas (Inep) Marcus Vinicius Rodrigues acusou publicamente o atual ministro da pasta, Ricardo Vélez Rodríguez, de ser incapaz de administrar o órgão. Rodrigues foi demitido após publicar uma portaria que adiava a aplicação da prova da alfabetização para 2021. Medida que, aliás, já foi revogada pelo próprio ministro.

Especialistas em educação acompanham o desenrolar da crise institucional com preocupação e até mesmo perplexidade, já que este é um ano crucial para a área, que tem a missão emplacar, por exemplo, a nova Base Nacional Comum Curricular. Ouvidas pelo Gazeta Online, as professoras Maria José Cerutti, Gilda Cardoso e Leda Maria Couto Nogueira enumeram os prejuízos que já começam a ser observados no Espírito Santo.

LEIA AS ANÁLISES

 “Perplexidade, impotência e enorme preocupação”

Gilda Cardoso, doutora em políticas educacionais e professora

A situação já passou do limite tolerável. Já estamos praticamente em abril e o MEC tem um papel de coordenador das políticas educacionais em âmbito nacional. Estados e municípios estão à espera de contratos, de convênios, de programas, de liberação de recursos, de decisões importantes do ponto de vista da organização curricular, formação de professores e está tudo paralisado. Isso pode comprometer seriamente os serviços públicos educacionais de todos os estudantes, da pré-escola ao ensino médio. Inclusive, o currículo do Ensino Médio está sendo implementado em sua primeira fase aqui no Espírito Santo este ano. A parceria com o governo federal é necessária porque são necessários recursos, assistência técnica, articulação para tomada de decisões.

Eu nunca vi nada igual, para ser bem sincera. Trata-se de uma área estratégica. O Ministério da Educação tem um orçamento gigante, um montante enorme de recursos que não estão sendo encaminhados adequadamente. A sensação é de perplexidade, de impotência e de enorme preocupação. A sociedade tem que estar em alerta máximo, pois isso não pode acontecer. A despeito de qualquer diferença política ou ideológica, as questões estratégicas para a educação devem ser tocadas e essa é a expectativa que todos os cidadãos têm.

“Muitos prejuízos vão surgir”

Maria José Cerutti, professora e presidente do Conselho Estadual de Educação

Os problemas gerados são sérios e trazem consequências das quais não temos ainda a dimensão. Muitas atitudes que deveriam ocorrer agora não estão ocorrendo. O período de alfabetização pela Base Nacional Curricular mudou de três para dois anos e há toda uma estratégia que deveria ser esclarecida. Até mesmo porque foi criada a Secretaria de Alfabetização e não sabemos qual será o trabalho dela e a repercussão disso nos trabalhos de alfabetização do Brasil. Há também a questão da formação de professores, sobre a qual há uma série de definições a serem tomadas. Existe o problema da educação especial. Foram reorganizadas secretarias dentro do MEC para traçar as formas de atendimento na educação especial e o Conselho Nacional de Educação está trabalhando em diretrizes curriculares para ela, mas que dependem de avaliação do MEC.

Há ainda a educação profissional, porque a base do ensino médio foi aprovada, mas agora os Estados teriam que começar a fazer o mesmo trabalho que foi feito no ensino fundamental e na educação infantil, mas ninguém sabe quais são os rumos que vão ser tomados. Isso traz atrasos para decisões nos Estados, por mais que eles já estejam caminhando. Muitos prejuízos vão surgir a partir disso. Estamos todos perdidos. É preciso dialogar com os Estados.

"Um órgão que se encontra no centro de uma disputa de poder"

Leda Maria Couto Nogueira, pró-reitora acadêmica da Universidade Vila Velha

Pelos acontecimentos deste ano, o MEC virou mesmo um campo de disputa mas não me parece que tenha cunho ideológico. São alas de um mesmo grupo, apoiadores do atual governo, disputando entre si. Permeando esses desentendimentos internos, aparecem declarações de possíveis desvios financeiros na educação, a extinção de cargos nas Universidades Públicas, a declaração de que o ensino superior público será pago etc. Isso vem junto com uma proposta de reforma da Previdência que traz prejuízos a alguns grupos de funcionários públicos enquanto melhora ou mantém os ganhos de outros grupos também de funcionários públicos.

Esses acontecimentos tão esdrúxulos desestabilizam o setor educacional, sem apontar nenhum norte sobre qual é ou virá a ser a política educacional do novo governo. Essa seria a definição mais importante para um país que ainda tem uma das piores educações do mundo. Ações como Enem e Enade serão mantidas? Isso afeta a vida de milhares de alunos e o trabalho de centenas de instituições. Como ficará o financiamento de bolsas de estudo e de programas de pesquisa?

De qualquer forma, no caso do ensino superior, notadamente o das instituições particulares, todas as ações desenvolvidas pelo MEC nos últimos anos, entenda-se aí também o Conselho Nacional de Educação, a CAPES, o INEP, FINEP, CNPq e outros, deixaram um legado de decisões que permite às instituições, por enquanto, continuar suas ações dentro de um regime de tranquilidade. Há, ainda, que destacar os funcionários de carreira do ministério que, mesmo sendo afetados por uma contínua troca de chefes, são aqueles que mantêm o órgão funcionando, governo após governo.

A estabilidade do funcionalismo público, tão debatida e criticada porque não permite a dispensa dos maus funcionários (e isso é uma pena) é a mesma que, nesses momentos, dá estabilidade a um órgão que se encontra no centro de uma disputa de poder.

Este vídeo pode te interessar

 

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais