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Advogados são alvo de duas mil investigações no ES

Advogados são alvo de duas mil investigações no ES

Captação ostensiva de clientes e disputa por honorários estão na mira da OAB no Espírito Santo

Publicado em 6 de julho de 2019 às 21:53

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Ilustração mostra um olho, em lupa, direcionado a uma balança da Justiça. (Ilustração)

Tramitam na Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Espírito Santo (OAB-ES), cerca de 2,2 mil processos ético-disciplinares. Trata-se de casos de supostas irregularidades no exercício da profissão que ainda passarão por análise do Tribunal de Ética e Disciplina da entidade.

Os fatos que levaram ao número não são necessariamente recentes. Podem dizer respeito a relatos de supostas infrações cometidas cinco, dez ou mais anos atrás. Portanto, parte dos mais de 2 mil casos podem estar apenas aguardando o reconhecimento da prescrição – quando chega ao fim o prazo regimental dentro do qual o processo poderia gerar punição.

Como um advogado pode ser alvo de mais de um procedimento, não é possível dizer que 2,2 mil dos cerca de 22 mil advogados registrados na OAB-ES respondam a algum processo disciplinar.

Entre os casos que tipicamente frequentam o tribunal da OAB, a captação ostensiva de clientes, panfletagem com oferta de serviços, denúncias de apropriação de créditos de clientes, disputas entre escritórios por honorários advocatícios.

Geralmente, os processos são abertos a partir de denúncias feitas por cidadãos, que não podem ser anônimas. Mas a OAB também pode agir de ofício, quando identifica má conduta de algum advogado.

Profissionais flagrados em crimes como de agressão física, embriaguez ao volante ou assassinato podem responder a processos administrativos por iniciativa da Ordem.

Tudo tramita sigilosamente. Apenas os envolvidos têm informação sobre processos admitidos. E as apurações administrativas costumam chegar ao fim sem que a sociedade conheça os resultados, ainda que sejam reconhecidas infrações.

Na OAB, um processo ético-disciplinar é prescrito basicamente em duas situações. Uma quando vencem três anos sem qualquer andamento. Outra é quando vence o período de cinco anos desde a comunicação do fato. Logo, é fácil concluir que prescrições fazem parte da rotina do tribunal da OAB.

Advogados consultados pela reportagem evitam atribuir a carência de punições e as prescrições ao mero espírito corporativista da entidade de classe.

Entre as razões elencadas por eles, o fato de as 11 turmas do Tribunal de Ética e Disciplina serem preenchidas por advogados que atuam voluntariamente. Não é raro que haja queda no quórum das turmas.

“Temos muita dificuldade para conseguir nomear membros para o colegiado do tribunal de ética. Não se paga nada e julga colegas de trabalho”, disse um ex-presidente de uma das turmas do tribunal.

Outro fator apontado como determinante para o acúmulo de processos é que, até 2016, a instrução dos processos – as etapas do andamento – eram feitas pelo conselho da OAB. Eram cerca de 20 pessoas para dar conta de toda a carga ações.

Depois, tanto as instruções quantos os julgamentos passaram a ser conduzidos pelas turmas. “E aí começou-se a ter mais vazão”, diz George Kilinsky, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-ES.

Fala-se, também, na dificuldade de localizar advogados que respondam a processos, inclusive por morte. Existem casos em que advogados dativos são nomeados para representar advogados não localizados nos processos internos. “Aí o advogado dativo não atendia mais. E tínhamos que instaurar procedimento contra o dativo”, contou Kilinsky.

O atual presidente do Tribunal de Ética e Disciplina, Alberto Nemer Neto, diz ter “carta branca” do atual presidente da OAB-ES para “não passar a mão na cabeça de ninguém”.

“Estamos há seis meses na gestão e ditando um novo ritmo. Garanto que o que fizemos em seis meses não foi feito em três anos, em termos de julgamentos, de sessões, de audiências”, declarou.

A preocupação com o ritmo, diz o advogado, está pautada no interesse em não prejudicar quem não cometeu infrações e sofreu alguma denúncia, e de não deixar impune quem infringiu norma funcional.

O ex-presidente diz que, em 2017 e 2018, cerca de 3,5 mil processos foram analisados, com mais de 300 sessões de julgamentos realizadas. George Kilinsky destacou que a gestão anterior enfrentou a necessidade de digitalização dos processos e a mudança no rito da instrução.

“Em nenhum momento sofri qualquer pressão de qualquer integrante do Judiciário ou da OAB. Essa questão do corporativismo vai muito de uma concepção que paira em cada instituição. Eu posso atestar que na OAB do Espírito Santo não há isso”, frisou, antes de complementar: “Azeitamos a máquina para a coisa funcionar. A nova gestão está dando prosseguimento a isso, o que é importante”.

PEDIDO DE INVESTIGAÇÃO GERA ATRITO

O tema das apurações internas contra advogados gerou atrito na classe após a Corregedoria da entidade enviar ofício à Polícia Civil sobre conduta de duas profissionais. Elas teriam aparecido em vídeos que “ensinam criminosos a se esquivarem da Justiça”.

A advogada Santuzza da Costa Pereira apresentou pedido de providências ao Conselho Federal da OAB contra a medida.

No documento, diz que o corregedor Renan Sales, “por determinação do presidente da seccional, José Rizk Filho, arvorou-se em verdadeiro ‘inquisidor’ da advocacia capixaba”.

O ex-presidente da OAB-ES Homero Mafra se pronunciou. “Não me imiscuí em gestão de tribunal ético, mas uma coisa posso dizer: na nossa gestão nenhum advogado teve seu processo ético mandado para delegacia de polícia ou teve seu sigilo aberto.”

O tema é espinhoso na classe. Advogados consultados dividem-se entre os que veem “atropelos” na condução e aqueles contrários à “mansidão” com quem deveria ser punido.

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Procurada para se manifestar sobre o pedido de providências, a atual gestão da OAB-ES informou que “há equívocos e desinformação no pedido” à OAB nacional e que está disponível para esclarecimentos.

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