Entrevista

Após 6 anos, chef Cleuza Costa fecha restaurante na Praia da Costa

Em entrevista, ela diz que as contas não fechavam e era hora de encerrar um ciclo; e adianta em primeira mão como será sua nova empreitada

Fernando Madeira

"Oi, coração". É assim que a chef Cleuza Costa costuma chamar os amigos e clientes mais próximos. E nesta semana o coração da mineira (mas que mora no Estado há 24 anos) anda batendo mais forte. Tudo porque no dia 10 de agosto, ela fecha as portas de seu restaurante que funcionou durante seis anos na Praia da Costa, em Vila Velha. A decisão é para ser coerente com o que pensa e com o momento que vive. "Foi uma decisão muito difícil e que tomei há três meses. A vida do empresário não é fácil e a economia não vive o melhor momento. Quando começa a dar mais preocupação do que prazer, é hora de avaliar. É um ciclo que se encerra", disse emocionada. 

Cleuza é uma das chefs mais conhecidas do Espírito Santo. Aficionada por gastronomia desde a infância, largou o curso de psicologia e decidiu seguir pelo caminho do seu sonho há 15 anos, após uma separação. Pupila do chef Juarez Campos, começou como estagiária voluntária do Aleixo e, um ano meio depois, virou subchef do restaurante. Frequentou cursos do chef Laurent Suaudeau, em São Paulo, ajudou a montar o Villa Vecchia (de comida italiana), até montar o seu tão sonhado restaurante: o Della Bistrô, onde cuidava pessoalmente da criação de todos os pratos e sempre estava na cozinha. Ali, conta, foi muito feliz. "Durante todos esses anos eu tive momentos incríveis, de felicidade interna, e de pessoas que passaram por aqui e levaram um pouco de mim e deixaram um pouco delas. É impossível não  se emocionar", conta ela, que também é colunista da Revista.ag e que no governo passado chegou a ficar 11 meses no cerimonial do Palácio Anchieta. 

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Nesta entrevista, Cleuza Costa relembra a sua trajetória, os melhores momentos vividos no restaurante, que teve fila na porta de uma hora nesses últimos dias. E revela os planos para o futuro.

Você não anunciou formalmente o encerramento do restaurante. Qual o motivo para fechar as portas?

Foram dias de reflexões. Hoje faço um balanço e só vejo coisas boas. O Della me trouxe uma visibilidade profissional, pessoas incríveis e um reconhecimento interno do quanto sou capaz de gerir. Mas chega uma hora em que temos que fazer escolhas. Esse ano fiz 41 anos e acredito que estou na metade da vida, quero desacelerar, e uma empresa exige uma dedicação muito única. Trabalhava 14 horas por dia, estudava mais quatro, dormia três, tudo isso eu já fiz. E se não fiquei rica até hoje, não vou ficar. Comecei a avaliar o quanto estava aproveitando os dias. Nesse autoconhecimento descobri que desacelerar era preciso e trazia um encerramento de um ciclo. Foram anos de muita dedicação.

Não foi é uma decisão fácil...

Foi muito difícil. Tem três meses que tomei essa decisão. Comecei a pesar as coisas, a vida do empresário não esta fácil, a economia não vive o melhor momento. Quando começa a dar mais preocupação do que prazer, é hora de avaliar. Hoje tenho 10 funcionários, um ponto comercial alugado, e isso gera uma preocupação. Não é só o esforço físico, mas também mental. Foi um processo de desligar (inclusive funcionários) que não esta sendo fácil. Aqui tem muito de mim, existe um luto. 

Não é fácil montar um restaurante....

Todas as vezes que trabalhei como chef era a criação. Tive um crescimento nesses seis anos que foi incrível. Tive que aprender a equilibrar a arte e a razão. Montar um restaurante nunca foi fácil e não é fácil manter ele ali. Aprendi que sou uma cozinheira nata, mas também aprendi a gerir.

E quando será servida a última refeição?

Amanhã, 10 de agosto. Esse dia não foi pensado, foi intuitivo. Era preciso ter uma data para não protelar o sofrimento. No início da semana estava muito chorosa. Sei que amanhã também será um dia emotivo. Quero voltar aqui no domingo sozinha, como tantas vezes vim, para olhar tudo isso aqui, tirar coisas pessoais, como minha coleção de cardápios, uma vaso e a poltrona vermelha. E espero que esse espaço se torne um que eu frequente. Passei tantos dias da minha vida aqui. Estou triste sim, mas leve. Existe um amor que vai demorar um tempinho para se desfazer. Não convidei ninguém para despedida, porque eu ficaria muito emotiva e talvez não conseguisse. 

Chef Cleuza Costa se despede de seu restaurante, na Praia da Costa, após 6 anos
Chef Cleuza Costa se despede de seu restaurante, na Praia da Costa, após 6 anos
Foto: Fernando Madeira

Como será fechar a porta pela ultima vez?

Vai ser sofrido. Vou deixar para viver naquela hora. 

Para você, qual a função de um restaurante?

São dois lados. O do chef que é glamouroso, que gosta receber e onde as pessoas vem para comemorar. Mas ao mesmo tempo é ser frio e racional. Tem que ter um controle muito grande.

Você costuma chamar os amigos e clientes mais próximos de coração. Como está o seu?

Esta cheio de gratidão. Estou emocionada, transbordando gratidão. Ele está leve porque sabe do trabalho que foi feito. Abraços e amor a gente não poupa e nem economiza. Eu fiz tudo aqui com muito coração.

Nesses 15 anos de carreira, qual a sua maior lição?

Que tem que fazer as coisas com o coração. A cozinha é muito intuitiva, da alma e de doação. Aprendi muito com várias pessoas, além de grandes chefs, cozinheiros, garçonetes... E também que a gente não pode perder a nossa essência.

Qual será a sua última refeição?

Será uma carne crua acompanhada de uma taça de espumante. Essa é uma entrada que faço há anos e ficou a cara do restaurante. Vários clientes dizem que ninguém faz igual, mesmo eu dando a receita. E não tem segredo, é uma carne picada com tempero. A pitada desse tempero é minha. Todas as vezes que alguém sentou aqui e pediu esse prato foi um momento especial. 

E agora, o que você vai fazer?

Vou tirar uma semana para ficar à toa. Estou me mudando de um lugar onde vivi por tantos anos e agora vou morara numa casa, na Prainha, perto do sítio histórico. E o quintal dessa casa será o lugar onde vou receber as pessoas e dar as minhas aulas de culinária. Vou continuar continuar cozinhando. É o que eu amo fazer.

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