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Sobre luzes e trevas
Inadmissível que brasileiros hoje queiram percorrer esse corredor de trás para a frente
Leiam a revelação abaixo. O filósofo Pangloss conta a seu discípulo, Cândido, como contraiu uma doença venérea que está ceifando a sua vida.
"Oh, meu caro Cândido! Você conheceu Paquette, essa bela acompanhante de nossa amiga baronesa. Saboreei em seus braços as delícias do paraíso que produziram esses tormentos do inferno que ora, como pode ver, me devoram. Ela estava infectada e talvez tenha morrido disso. Paquette recebera esse presente de um franciscano muito instruído que havia remontado às origens, pois o havia pegado de uma velha condessa que o tinha recebido de um capitão de cavalaria que o devia a uma marquesa que o pegara de um pajem, que o recebera de um jesuíta que, quando noviço, o herdara em linha direta de um companheiro de Cristóvão Colombo. Quanto a mim, não o passarei para ninguém, pois estou morrendo."
A passagem está no conto “Cândido”, obra-prima de Voltaire, publicada em 1759. Sim, o filósofo iluminista Voltaire, pseudônimo de François Marie Arouet. O mesmo que nos ensinou: “Posso não concordar com nenhuma palavra do que você disse, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”. (Há controvérsias se a frase é mesmo dele, mas com certeza traduz a essência do seu pensamento.)
Vejam, 1759! Há 258 anos, Voltaire abordava, desabridamente, doenças sexualmente transmissíveis entre homens e mulheres da sociedade da época. Ele, que estudara em colégio religioso e que mais tarde se rebelaria contra a hipocrisia de seu meio social, tornando-se um crítico mordaz dos costumes, das crenças e do obscurantismo de uma França intelectualmente atrasada, no auge do absolutismo monárquico (uma França baseada na sagrada aliança entre o Estado e a Igreja).
Voltaire é um dos vultos do Iluminismo francês no século XVIII, o século das luzes, quando a Razão chegou para ficar de uma vez por todas na História (quer dizer...). Quem for ao Palácio de Versalhes vai ver lá um busto dele no fim do corredor dos grandes pensadores homenageados. Ah, em outros salões do palácio, verá nus artísticos também.
Inadmissível que brasileiros hoje queiram percorrer esse corredor de trás para a frente. Voltaire, sim! Voltar, não!
Afinal, como escreveu John Steinbeck, “quando uma luz se apaga, fica mais escuro do que se ela jamais tivesse brilhado”. Pensem nisso. Muitos lutaram para garantir a democracia. Ela veio, chegou para iluminar as trevas, trazendo consigo as luzes da liberdade de expressão. Com suas imperfeições, ainda é melhor do que qualquer regime de governo autoritário. E o Brasil, como nação, não pode voluntariamente optar pelo retorno às trevas da censura tacanha e do arbítrio. Sob o risco de cair em um breu maior do que nunca.
Museu de novidades
Doria e o MBL surgiram vendendo-se como o “novo” na política brasileira. Doria hoje está fechado com o governo Temer, o DEM e Aécio. Quanto ao MBL, apoia Doria ao Planalto e mostra condescendência obstinada em face a Temer.
A estratégia do MBL
Segundo a Piauí, em um grupo do WhatsApp com financiadores do MBL, um dos coordenadores do movimento, Renan Santos, explicitou a estratégia para eleger Doria: “Com ou sem psdb. A aliança q pode lhe eleger está no pmdb dem evangélicos agro e mbl. Nosso trabalho será o de unir essa turma num projeto comum”.
A pergunta que fica
O que pode haver de menos novo, politicamente falando, do que, em nome de um projeto eleitoral, aliar-se com o carcomido quadrilhão do PMDB que está na situação, com o DEM (descendente em linha direta da Arena), com o agronegócio (ruralistas estão aí desde o Brasil Colônia) e com as bancadas evangélicas? Engraçado é que esse museu de novidades eles querem manter bem aberto.
Discurso de conveniência
Os mesmos que enxovalhavam o Estatuto da Criança e do Adolescente (uma lei enorme e complexa) para defender a redução da maioridade penal agora deram para citá-lo sofregamente ao de repente “se lembrarem” de que é a mesma lei que estabelece classificações etárias. Ué, mas não era “só uma lei feita para proteger bandidinhos”? Agora de repente é boa?
Ah, só para lembrar
O Ecriad é a lei que assegura todos os demais direitos de crianças e adolescentes brasileiros. Merece mais respeito.
Euclérigo
E Euclérigo Sampaio, hein, será que já se arrependeu de seus pecados legislativos?
Cena política
No livramento de Temer (parte 2) na Câmara, na última quarta, os debates tiveram menções a cães e até a porcos. “Se faz dessa figura alvo de flechas construídas a partir de bambus enlameados, porcos, sujos”, disse, da tribuna, o advogado de Temer, Eduardo Carnelós, para atacar Janot. “Venham para a luta, seus acadelados! Mais uma vez vamos derrotá-los!”, provocou o trombador de Temer na Câmara, deputado Carlos Marun (PMDB-MS). Enquanto isso, leitores, adivinhem só quem mais uma vez paga o pato...